MEMÓRIAS E DATAS QUE MARCARAM VÁRIOS ACONTECIMENTOS NA NOSSA TERRA

 

Coisas e Gentes da Nossa Terra

 

 

Agricultura, antigamente lavoura:

 

Jeiras, Jeireiros e outras peripécias:

Até ao final da década de 1980, havia na nossa terra, muito trabalho no campo. As máquinas agrícolas eram ainda muito poucas, e os nossos lavradores mais abastados, davam muitas jeiras a ganhar, não sentindo dificuldade nenhuma em conseguir mão-de-obra barata, havendo, sempre, mais oferta que procura. Em 1962, o preço da jeira (jorna) diária (de enxada), era de dezassete escudos para as mulheres, e vinte escudos para os homens (0,085 e 0,10 cêntimos do euro).

Em 1975, o preço da jeira diária variava entre os noventa e os cem escudos (0,45 ou 0,50 €), e a jorna ou jeira tinha início no campo antes do nascer do sol, ou seja: os obreiros ou jeireiros do campo começavam a trabalhar desde o nascer do sol e despegavam ao pôr-do-sol, ou ainda mais tarde, quando do “toque das trindades” ou “Ave-Marias” do sino da igreja, de acordo com a exigência do patrão. Também o toque das Trindades era o relógio de ponto dos que não tinham relógio e hora de recolher a casa para os não adultos.

Antes de nascer do sol ou ao romper do dia, os trabalhadores tinham que já se encontrar em casa dos patrões com as suas ferramentas de trabalho, para “medir o vinho”, donativo obrigatório do patrão, ainda colocado em cabaças, e a medida era uma “canada” (dois litros), por dia completo de trabalho. Se porventura, fosse só meio-dia de trabalho, era dada meia canada (um litro). Havia alguns patrões menos escrupulosos não tinham vergonha na cara em dar aos jeireiros vinho com gosto ao coveiro (madeira podre), vinagre ou até mesmo já prensado das borras das pipas. Essas borras do fundo das vasilhas, já um pouco avinagradas pelo tempo na vasilha, eram normalmente colocadas dentro de sacas de lona ou sisal e penduradas numa trave de madeira à espera que escorressem lentamente para depois esse vinho mais avinagrado ainda ser bebido pelo pessoal da jeira.

O mata-bicho (pequeno almoço) no monte, que pouco mais passava de uma côdea ou cibo de pão centeio com uma “talhada” de carne gorda frita na sertã, ou na melhor, um ovo frito, a maior parte das vezes dividido por mais do que uma pessoa, era comido por volta das 8 horas normalmente quando passava a carreira (autocarro) a caminho de Valpaços, momento de referência horária, já que quase ninguém tinha o privilégio de usar relógio nesse tempo. O almoço, na época mais conhecido por “jantar”, já que à noite se chamava “ceia”, era transportado para o monte pelas mulheres à cabeça dentro de uma cesta de verga.

Os garrafões de 5 litros de vidro, muito escassos, só começaram a aparecer na nossa aldeia em finais da década de 1960, e o revestimento do vidro era feito em verga, tipo palha; mais tarde, meados da década de 1970, é que apareceram os primeiros com revestimento em plástico.

Anteriormente havia só bilhas de barro para a água e garrafões feitos também de barro para o vinho, normalmente de cor preta, com capacidade equivalente a (+-) uma remeia (6 litros = 3 canadas), e em vidro, com revestimento de verga, com capacidade de 16 litros, equivalente a 8 canadas, ou 32 quartilhos, como se dizia nessa época. Só possuía este tipo de vasilhame a gente com mais posse.

Todavia, o transporte do vinho e azeite para outras localidades era efectuado em obres carregados em cima dos animais de carga, normalmente feitos de pele de cabra. Depois da década de 40,  o vinho em pipas começou progressivamente e/ou lentamente a deixar de ser transportado cima de carros de bois.

Outrora, nos vasilhames de maior capacidade, tais como ânforas feitas de barro e, mais tarde, de chapa de zinco, era colocado um pouco de azeite para o vinho não azedar/envinagrar. O azeite, como é um líquido mais leve do que o vinho, vinha ao cimo da ânfora e revestia/cobria todo o vinho. Este, como não apanhava ar, não envinagrava até se acabar de tirar todo pela torneira do fundo da vasilha.

No nosso meio rural os garrafões de 5 litros eram também conhecidos por outros nomes, como por exemplo: Vergas; Palhinhas; Faustino; Kodak Português, etc. As restantes medidas de capacidade de líquidos, como: cântaros, remeias e regadores, eram todos eles fabricados em chapa de zinco.

Havia alguns patrões que davam o mata - bicho aos jeireiros/trabalhadores que chegassem a casa deles antes do nascer do sol ou romper do dia. Normalmente tratava-se de um copo de aguardente, cachaça como era tradicionalmente falado, e um punhado com meia dúzia  de figos secos. Quem chegasse atrasado, ou seja: um pouco depois de nascer do sol, alguns patrões (poucos) já não mediam o vinho aos jeireiros. Enfim, sempre os mais frágeis, particularmente os mais pobres a serem castigados por esse atraso mínimo.

Ouvi dizer que até chegou a haver na nossa terra um proprietário agrícola (patrão) residente no bairro do Pontão, que por vezes levava a pé (com a rédea) para o monte o cavalo com a albarda aparelhada e ao lado seguia o criado ou jeireiro com a charrua às costas. Também no mesmo bairro, um outro, que por vezes guiava a pé com a rédea o burro(a) para as suas propriedades de Valbemfeito e a albarda em vez de ir em cima do animal, ia encartada às costas do dono. Enfim, tempo de gente pobre e submissa aos mais abastados ou poderosos.

Em 1951, o preço do litro do vinho, variava entre os 2$00, ou 2$50 (pouco mais que um cêntimo). Era costume dizer “2$50”: dois e quinhentos, ou: vinte e cinco tostões, ou: dois escudos e cinquenta centavos.

Havia ainda nesse tempo, alguns (poucos) proprietários menos escrupulosos na nossa freguesia, que na limpeza das pipas do vinho, aproveitavam as borras, metiam-nas dentro de um saco de lona e penduravam-no numa trave para as espremer (prensar, como se dizia). Esse vinho, já por vezes bastante acidulado (envinagrado), era dado aos jeireiros/obreiros, para o dia de trabalho.

Só a partir do final da década de 1970 é que se deixou de trabalhar à jorna (jeira) diária de sol-a-sol. Havia nesse tempo as merendas, mas que só começavam a 25 de Março, por já serem dias de trabalho bastante longos. Esse dia era conhecido na zona rural como  o dia da Srª. das Merendas. A partir do dia 3 de Maio havia já duas horas de intervalo para o período do almoço e descanso.

Até por volta de meados da década de 70, houve na realidade bastante miséria, com maior incidência, como é óbvio, nos mais pobres e necessitados, a grade maioria do povo, sobretudo no que diz respeito ao vestuário e alimentação. No tocante à esta última, valia mesmo a carne gorda do porco salgada, oferecida pelos lavradores proprietários mais abastados que sobejava, comida cozida ou em cru, por vezes até já um pouco rançosa (cor amarelada) do tempo, ou outra, como, por exemplo, o “enguião”, que é uma tira grossa de carne “gorda” do lombo porco (suã) de aproximadamente um metro e tal, na altura e de 6/7 centímetros de espessura, extraída do rabo até ao cachaço do animal, que nesse tempo se costumava pendurar no tecto por causa dos ratos, a fim de ser comida aos bocados, cozida ou até mesmo crua. Se o enguião do porco não tivesse, pelo menos, uma mão-travessa de carne gorda, diziam que o porco era fraco.

Os chíchar(r)os (feijão frade) cozidos com couve galega no dia-a-dia. Quando a não havia no início do verão, servia mesmo a rama da batateira mais tenra, onde a maioria dos pobres, particularmente com mais filhos, comiam todos do mesma travessa centrada na pequena mesa, não sendo necessário contar pequenas histórias ou contos aos mais pequenos para lhe abrir o apetite. Essa travessa de comida para todos era varrida num ápice. Era quase sempre o filho mais novo da casa que lhe era incumbida a tarefa de ir buscar a pota do vinho à pipa quando havia, mas quando chegava à mesa, já a travessa ia a meio. A maior parte das vezes os chícharros eram peguilhados com pimento, tomate, pepino, feijão-verde, malaguetas, tudo curado no vinagre em talhas de barro, pois não havia outra coisa, mas era os pimentos os demais fartura. 

Havia antigamente umas travessas em barro, mais tarde em alumínio e depois já esmalte, às quais o povo lhe chamava também de “fontes”, por serem fundas e com um rebordo na base para não escorregar na mesa quando as pessoas introduziam os garfos para comer em conjunto, ou seja: todos da mesma fonte. Os garfos eram todos fabricados em ferro e algumas pessoas costumam alargar-lhes os dentes para carregar mais comida. Enfim, tempos ancestrais que deixaram poucas recordações a muitas pessoas que carregaram às costas esse tempo de pouca ou até nenhuma abundância.

Voltando a alguns ingredientes comestíveis, até mesmo as pútegas (púrtigas como o povo lhe chamava), minúsculos tubérculos de cor amarela e arredondada que se dava no monte nos pés e raízes dos charguaços de flor branca, fazia parte da alimentação do mais pobres. Não esquecendo todavia, os “grijós,” também um pequeníssimo tubérculo de um planta que em certa época do ano se dá no monte junto aos lameiros de alimentação do gado; as azedas, as massacucas, que é o fruto do carvalho e os colhões (quilhões) de galo das leiturgas e outros sabores de arbustos e plantas silvestres que se dão no monte. Excelentes petiscos (conduto) para o mata-bicho ou merenda dos mais jovens e até de adultos de antigamente, particularmente até meados da década de 70.

Ainda as amoras das velhas amoreiras de Laudemira Ferreira (Cagigal) do cimo do bairro do Sobreiró que ainda hoje existe (2014) e Francisco (Mofreita Reis?) no início da rua do bairro de Stª. Maria Madalena, já derrubada pelo falecido senhor Francisco Mofreita em meados da década de 90 por influência de um vizinho próximo, Dr. Luís Lopes. Esta última era a mais importante, já que era quase pública, de melhor trepar e ficava mais á mão.

Atendendo que nessa altura os casais tinham muitos filhos, a invernia era longa, dura e com pouco trabalho, e a comida em casa era muito pouca, já com uma sardinha a ser repartida por dois ou até três da casa, a maior parte dos jeireiros do trabalho do campo  iam pedindo emprestado aos patrões durante todo o ano vários produtos para beber e comer, tais como: vinho, azeite, cereal, feijão, chicharros, etc.. Enfim, estavam quase sempre penhorados nos lavradores proprietários do empréstimo que lhe davam a maior parte do trabalho ao longo do ano. Para alguns desses mais podres e necessitados e ainda carregados de filhos em casa, até a palha para encher o colchão onde dormiam era dos palheiros dos outros.

Porem, se havia algum deles que matava um porco (céba), os presuntos e as mãos de carne magra, eram para vender, para comprar um novo porco (reco) para o engordar durante todo o ano e ainda para as batatas da semente, a maior parte das vezes semeadas em pequenos terrenos ou poulas (terras menos férteis) de alguns proprietários que os emprestavam com o intuito único de lhe estrumarem alguma terra e até mesmo cobrando-lhe ainda parte dos produtos colhidos. Só havia nessa altura uma industria na aldeia que ia dando umas jeiras durante um curto período de inverno, que era o  largar de fazer o azeite, prensa como lhe chamavam, mas era só para uma dezena deles, quase sempre os mesmos a trabalhar na casa.

Sempre houve algumas jeiras específicas mais bem pagas, ou acima da média (do que as de enxada), com as do trabalho de pedreiro, enxertia, ceifa e extracção de cortiça. Recordo aqui alguns bons enxertadores:  “Zortor”, João e Arménio Vieira, todos já falecidos, e ainda, Filipe Nascimento “Palheiras” e Agostinho Mosca Pires “Nascimenta”, entre outros.

Hoje (2010), na nossa aldeia, só uma dezena de trabalhadores (jeireiros) sobrevivem destes trabalhos do campo, mas já sem as necessidades económicas desses tempos, e o medir da “canada do vinho”, passou para memórias de outros tempos. O preço da jeira diária (de enxada) é 40 euros, para as mulheres, e 50 €, para os homens.

Quanto ao preço do vinho no lavrador/agricultor, este não tem acompanhado o custo dos produtos agrícolas e, acima de tudo, o valor pago pelas jeiras aos trabalhadores, estando neste momento entre os 5/6 euros o preço do garrafão de 5 litros; motivo pelo qual se tem traduzido num substancial abandono das vinhas por parte dos proprietários agrícolas, não falando ainda, é claro, no valor do preço das uvas pago a estes por parte da Adega Cooperativa, que ainda é bastante inferior ao vinho vendido directamente pelo agricultor.

 

Apanha da Azeitona:

Esta apanha foi sempre feita com o esforço humano, se bem que havia quem o fizesse de forma diferente.

Até finais da década de 1950, alguns lavradores mais abastados, apanhavam a maior parte da azeitona das oliveiras ripada à mão, com ajuda de escadas de madeira (bem altas) e cestos de verga, para não “ferirem” as corpulentas oliveiras dessa época. A maioria e de menos posses, utilizavam as varas de varejar e varejavam a azeitona para o chão/terra. Contaram-me, que os primeiros toldos de lona (de pequena dimensão:2mx2) para a apanha da azeitona, só começaram a aparecer também em finais da década de 1950, e que os primeiros vistos na Freguesia foram comprados pela falecida Dª. Albertina Cunha, mais conhecida por Dª. Tute, na altura residente no bairro do Pontão.

A partir do início da década de 1980, começaram a aparecer as primeiras limpadoras de azeitona fabricadas nas vulgares serralharias em verguinha de ferro num sistema artesanal, que vieram substituir as pás de madeira e que só em dias de algum vento é que podiam funcionar para eliminar ou retirar as folhas da oliveira. Todo esse trabalho foi mais tarde substituído, quer pela Cooperativa dos Olivicultores, quer pelos lagares particulares com as novas tecnologias implementadas, a partir de finais da década de 1990 ou início de 2000.

Por volta do ano 2001, apareceram também as primeiras máquinas a gasolina de varejar. A primeira foi adquirida por Sidónio Costa do Bairro do Sobreiró, e a segunda, um ano mais tarde, por Simão Domingues do Bairro dos Ciprestes. Hoje já existem bastantes na freguesia.

Até finais da década de 1980, era costume em todas as aldeias, após algumas colheitas agrícolas, os mais necessitados, irem pelos campos, fazer um aproveitamento de alguns frutos que ficaram na terra, não apanhados, ou vistos, pelos proprietários; a estas sobras, chamava-se: “Rebusco” e “Galela”. Com  o fecho das tavernas/comércios e da melhoria das condições de vida das pessoas, acima de tudo, dos mais pobres e necessitados, este aproveitamento salutar foi-se perdendo.

O “Rebusco”, era a azeitona (bagos) aproveitada nos olivais depois da apanha. Os mais novos, vendiam-na ao quilo a alguns comerciantes/taverneiros, para arranjar uns tostões, ou mesmo escudos, destinados a pequenos gastos pessoais; os mais velhos, ou a vendiam aos mesmos comerciantes para ajudar nalgumas despesas do lar, ou aproveitavam-na para a trocar no Lagar/Prensa, por azeite. Havia comércios nessa época que chegavam a comprar mais de uma tonelada de azeitona só do rebusco, nomeadamente o dos Senhores: António Teixeira, Adelaide Astorga, Xico Volante, e mais tarde, o de Adelino Melo Alves e Domingos Mosca Pires.

Em finais da década de 1960, o preço do quilo de azeitona do rebusco pago pelos comerciantes, variava entre 2$00 e 3$00 (escudos), agora (0,01 e 0,015 €). No início dessa mesma década o quilo do rebusco era pago entre $50 e $70 centavos (0,0025 e 0 ,0035 €).

Também havia o “Rebusco das Castanhas”,  que era feito depois da apanha e dos castanheiros “Soutados” pelo proprietário, sempre após o  dia 1 de Novembro (dia de Todos -os- Saltos), mas neste caso era só para comer. Santa Valha nunca foi terra de muitos castanheiros. Os poucos soutos que havia, encontravam-se na zona de Monte Cerdeira, Castelo e Sandim, parte mais alta e fria da aldeia.

 A “Galela”, era (pequenas) uvas que ficavam nas vinhas depois de o agricultor vindimar e que davam, por vezes, para fazer um pipo de vinho aos que não as tinham.

 

Lagares de Azeite:

Chegaram a existir quatro, todos eles artesanais. Dois, puxados por animais, ambos no Bairro dos Ciprestes, pertencentes a João José Cardoso, mais conhecido por João Ribeiro e Casa dos Ciprestes (Sarmentos). Hoje, esta casa solar ou quinta, só já possui 1/10 das propriedades agrícolas de então, nomeadamente olival, vinha e outras de sequeiro. Está actualmente transformada em turismo em espaço rural e/ou de habitação. Faziam o azeite também de lavradores particulares.

No início da década de 1960, os dois puxados por animais, fecharam a actividade; este último, dos Ciprestes, por ter sido destruído por um incêndio, que diziam, ter sido provocado um cigarro de um criado mal apagado. Os restantes dois, já no sistema industrial, um deles de Manuel Nascimento Barreira, no Br. dos Ciprestes e o outro de Raul Victor Videira, no Br. da Maceira ou Maçaira. O primeiro, o de Manuel Barreira,  iniciou a actividade ainda na década de 1940 e encerrou definitivamente por volta de 1966. O segundo, de Raul Videira, iniciou a actividade em meados da década de 1950, vindo a encerrá-la nos finais da década de 1960, ou início de 1970. (Ver Link-Economia).

O preço do almude (25 litros) de azeite no lavrador em finais da década de 1980 variava entre os 24 e 25 contos, equivalente a 120 e 125 €. Hoje, passados trinta anos, o preço é inferior e a qualidade do azeite é muito superior, tendo em conta as novas tecnologias em vigor, quer a nível de higiene, quer no sistema de extracção, incluindo a acidez do produto. Enfim, coisas da nossa actual política agrícola comunitária em que estamos agora inseridos. 

 

Último Lagar de Vinho Artesanal, com Prensa e Fuso de Madeira:

Pertenceu a João Atanázio do Bairro dos Ciprestes e datava de 1856. A prensa e fuso de espremer o bagaço de madeira foram retirados em 2007, restando só o lagar em pedra. Até à década de 1960 as uvas sempre foram pisadas pelos pés dos homens. A partir dessa data,  Alice Fernandes e Arnaldo Domingues (Augusto Simão), compraram os primeiros esmagadores de uvas manuais, mas, era necessário, muita força humana para os conseguir mover. Hoje, apesar de já haver muitos eléctricos e a Adega Cooperativa para os agricultores associados, ainda se continua a manter a velha tradição de pisar as uvas com os pés dos homens. Até início do século XX, Santa Valha pertenceu à área/zona vinícola demarcada do Douro, tendo em conta a qualidade castas produzidas e o micro-clima existente, contribuindo desse modo, para excepcional qualidade do produto.

 

Alambiques de Destilar:

Esta indústria artesanal caseira foi até final da década de 1980 muito próspera na nossa aldeia. Existiram sempre a laborar muitos “potes de destilar” como eram,  e ainda hoje são conhecidos por nós. Eram aquecidos a lenha e quase todos os bons lavradores, tinham esta indústria caseira. Com a adesão progressiva dos nossos lavradores à Adega Cooperativa, e ainda à nova e rígida legislação/lei Comunitária que entrou no país conhecida como: “a lei do álcool,” esta tradição caseira, perdeu-se quase na sua totalidade. Hoje só resta três ou quatro particulares a acender o “pote”, mas só para consumo de casa.

Corticeiros: Nos montes da nossa terra sempre existiram muitos sobreiros. Hoje já poucos restam, devido aos incêndios que têm destruído a nossa floresta. Lembro aqui alguns nomes de conterrâneos corticeiros que trabalharam nesta profissão ao longo do século passado: “Ti” Vila Real e filhos, Artur e Toninho Pereira; João Atanázio “Polino”; Luís Pereira, e outros mais. No tempo destes, a cortiça era extraída à comissão ou de meias. Mais tarde, os irmãos “Periquitos”: Berto e Toninho Moreiras, Toninho Rodrigues e Zé Moreiras, Artur Rôlo, etc., mas com o trabalho já remunerado a dinheiro. Negociantes na nossa freguesia: Manuel Barreira, Domingos Mosca Pires e Gabriel Quintela (Cruz).

 

Pastores e Rebanhos: Dizem os mais idosos e de boa memória que nos anos de 1940 e 1950 chegaram a existir “só na nossa aldeia”, dezassete rebanhos de ovelhas, carneiros e cabras, todos eles, propriedade de lavradores mais abastados, não falando, é claro, de uma ou duas cabras ou cordeiros de engorda que quase todos os pobres tinham em casa, a maior parte para vender. Há ainda uma ou outra pessoa que diz ter ouvido aos mais velhos, que foram mais e que foram sim: vinte e dois rebanhos e uma cabrada, mas que alguns desses não eram mais do que pequenos “tagalhos”.

Todos os pastores desses rebanhos pernoitavam a maior parte do ano no monte com os seus animais e cães de guarda, para os defender dos lobos. Essa pernoita, servia para os rebanhos de ovelhas poderem estrumar (adubar) as terras de cultivo. Os rebanhos eram recolhidos entre cancelas. O povo chama a isso, de “acancelar”.

O dormitório ou abrigo era em carretos feitos de madeira (em triângulo) normalmente com cobertura de palha e algumas tábuas de madeira. Mais tarde, década de 70 ou 80, já um ou outro com cobertura de chapa de zinco. Essa estrutura era de fácil transporte de uns locais para os outros. Normalmente era feita em cima de carros de bois, onde a palha de centeio estendida no chão do carreto servia de colchão. Recordo aqui alguns nomes de pastores da nossa terra, não só desse tempo, como mais recentes: Rocha; Anastácio e filhos; Augusto Mairos e filhos; Mário Picamilho; Manuel Jesus Mata, conhecido por Manuel “Ligeiro”; irmãos: Adamastor, Arménio e Zé Miguel, entre outros. Dada a pobreza dessa época muito raramente se encontrava um pastor proprietário do seu rebanho de ovelhas ou cabras.

Em 2010, só existem oito rebanhos de gado de ovinos em toda a nossa freguesia: dois em St. Valha: Qtª. da Teixogueira (Manuel), e o de Aníbal Picamilho. No Gorgoço: dois, Abílio e Pardal, e em Pardelinha, quatro: dos irmãos Serras (Miguel, Armando e Artur) e o de José Joaquim Fontoura Lopes.

 

Primeira Malhadeira de malhar Centeio:

Antigamente as tarefas da ceifa, mais conhecida entre nós por segada, e a debulha, por malhada, eram ambas feitas à mão. Foi por volta de 1943 que apareceu na nossa aldeia a primeira malhadeira de malhar centeio. Esta máquina industrial pertenceu em sociedade a Vasco Proença de St. Valha e a Olímpio Seca (médico) de Vilarandelo mas com terrenos agrícolas em Pardelinha herdados de seu sogro, João António de Castro. Mais tarde, 1955, Arnaldo Domingues, também conhecido por Augusto Simão, veio a adquirir outra.

Todas estas pequenas máquinas eram movidas com ajuda de um motor a gasóleo marca “Lister”, transportadas para as eiras com a força das juntas de bois, mas que não limpavam o cereal. Era por isso necessário recorrer a umas máquinas limpadoras movidas manualmente e conhecidas por “Tarara”, a maior parte delas de fabrico Inglês: uma pertencia, a  “Domingos do Padre” ex-Regedor e outras duas, a Benjamim Picamilho. Também o Professor Carolino Augusto Afonso teve uma na sua Quinta da Teixogueira, hoje propriedade de museu de Paulo Jorge Teixeira do bairro do Sobreiró por troca de trabalho de carpintaria e o Casal/Solar dos Aciprestes teve outra, mas estas só para serviço dos próprio. Ouvi dizer também que a máquina propriedade da Casal/Solar dos Aciprestes tinha sido anteriormente de Benjamim Picamilho e que já não existe para recordação e memórias por ter ficado muitos anos ao abandono no curral perto dos animais.

A partir do início da década de 1960, com a entrada destas máquinas, as malhadas com malhos nas eiras, foram acabando. Seguiram-se posteriormente outras já mais modernas em todos os aspectos, que tinham normalmente a marca “ São Romão do Coronado”, mecanismo movido por correias já com a ajuda de um tractor. Penso ter sido até finais da década de 1980, ou início de 1990. Pertenceram ao filho do Sr. Augusto, Gilberto Domingues, chegando a possuir duas ao mesmo tempo e a ser o único durante muitos anos a prestar serviços com estas máquinas na nossa freguesia e não só.

Por volta de 1995 Armindo Lampaça Parauta comprou uma malhadeira em segunda mão, já bastante desgastada das inúmeras pousadas (1=5 molhos = 1 alqueire) de centeio que malhou anteriormente. Chegou ainda na sua mão a malhar algum centeio (pão, como se dizia) de alguns ainda resistentes deste sistema de cultura agrícola. Os últimos serviços de malhada que fez foi na eira das Lages em Santa Valha, e numa eira em Fornos do Pinhal, local este, onde veio a sofrer um acidente e a ficar bastante estragada, não compensando reparação. Foi de imediato transportada para St. Valha, onde veio a apodrecer numa propriedade agrícola e a servir de memória para este capítulo de conto de datas, memórias e recordações. Foi esta a última malhadeira que malhou/debulhou na nossa freguesia.

O fim da actividade destas “ malhadeiras”, deveu-se ao facto de aparecerem no mercado as novas e modernas ceifeiras já equipadas para ceifar (segar, como de dizia antigamente e ainda hoje muitos continuam a dizer), malhar, limpar e pesar, e ainda, e sobretudo, a enorme redução das sementeiras de cereais, por parte dos nossos agricultores. Recordo aqui um bom trabalhador e especialista em  “meter” molhos de palha de centeio nas malhadeiras: O saudoso Carlos “da Albertina”.

Desde 1974 e até finais da década de 1980, ainda chegou a existir também na aldeia, uma ou duas pequenas máquinas de ceifar centeio, que também apertavam os molhos, fazendo ainda, com a ajuda de outra lâmina a “segada” dos fenos. Tinha um pequeno motor a gasóleo, e era manipulada por um homem a pé. A primeira pertenceu a Gilberto Domingues e a segunda, mais tarde, à família Parauta. O mesmo motor também a fazia mover através de duas rodas.

Anteriormente, até ao início da década de 1970, as ceifas (segadas) eram feitas à mão. Como havia poucas searas de centeio (pães) para segar na nossa freguesia, conhecida por zona de terra quente, os segadores juntavam-se em grupos de 5 a 10 homens, e até mais, mais conhecidos por camaradas, liderados por um chefe, a quem chamavam de capataz, normalmente a pessoa mais idosa do grupo e com mais jeito de liderança. Tinham que se deslocar a pé para outras aldeias de outras freguesias do Concelho onde houvesse mais trabalho, como: Monte de Arcas, Tinhela, Fiães, Quintela, Ervões, Etc.

Após o trabalho concluído nessas aldeias do nosso Concelho, seguiam também a pé para segar centeio e trigo em outras aldeias dos concelhos de Mirandela, Vinhais e Bragança. Houve ainda alguns que chegaram a segar em algumas freguesias do Concelho de Macedo de Cavaleiros, e até mesmo em Espanha, mais concretamente na zona da Raia, como nos contou um dos últimos segadores que integraram as camaradas, Luís Augusto Rua, na altura um jovem com 18 ou 20 anos de idade.

Contaram-me alguns segadores ainda felizmente na nossa companhia, que em finais da década de 1950,  segaram e ataram em muitos locais da terra fria, como: Torre Dona Chama, Aveleda, Agrochão, Lamalonga, Ervedosa, Nogueira, Portal de Penhas Juntas, Edrosa, Melhe, Srª. da Serra, Lombada, Etc,. Etc., Etc., que esse trabalho de sol-a-sol era muito árduo, para só virem a receber uma jeira diária de 18$00 (dezoito escudos), equivalente hoje a 0,09 €. Acrescentaram ainda, que nas deslocações que faziam a pé, já que não havia transportes nessa época, tinham que carregar às costas, uma ou duas foices (ceitouras), a pedra de afiar, os dedais, e um saco de lona com uma muda de roupa e pouco mais. O calçado era uns socos/tamancos, que por vezes iam às costas para os não gastarem. Era o calçado que normalmente se utilizava nessa época.

Em 1958 o preço da jeira (jorna) diária era de 18$00 (0,09€); em 1964, era de 20$00 (0,10€); em 1970, era de 25 a 27$50 (0,12 € a 0,14 €) e, em 1972/1973, rondava os 40$00 (0,20€), foi o que recebeu Luís Rua e os seus colegas camaradas, um dos últimos jovens de Santa Valha que na altura tinha 18 ou 20 anos de idade a fazer este género de trabalho e que estava integrado numa camarada de segadores da nossa terra.

Entre muitos outros, referencio aqui alguns bons segadores de que me falaram: José Augusto Rodrigues, mais conhecido por “Augusto Letras”; Quim da Teresa; Manuel Maria Modesto, mais conhecido por Floriano em virtude de sua mãe se chamar Maria “Floriana”; Ti Sá; Albertinho Fernandes;  Carlos da Albertina; António Teixeira; Alberto Moleiro; Irmãos Capelas: Cândido e Manuel Catalão ; Armindo Cruz Pinto (Caliboi); João Atanázio “Polino”; Alípio Cardoso; Alípio Fontoura; Manuel Amendoeira; irmãos: Cesário  e Zé Espiritosanto; irmãos: António “Periquito” e Amadeu Moreiras; Luís Pereira; irmãos: Júlio e Raul Pereira; Filipe Nascimento (Palheiras); irmãos: Luís e Aníbal Barreira; Manuel Barrosão, irmãos:  Mário (da Clara), Augusto e Vicente Vergueira; Joaquim Rito; Heitor Tender; Manuel Rôlo; António e Raul Santos “Simplício”; Fernando Barreto Fernandes (Babau); Vicente Domingues; Adriano Garcia da Mata; Luís Atanázio (Polino), Etc. Mais tarde, e ultimamente: Artur Fontoura (Sá); Luís Rua; Fernando Pardal; Gentil Mosca Pires.

Havia também mulheres a segar centeio (pão) na nossa aldeia, mas só em ceifas de casa ou de ajuda a alguém amigo.

 

Primeiro Tractor Agrícola:

Início da década de 1960, de Manuel do Nascimento Barreira, de marca Massey-Fergusson 135, com só de quatro velocidades (1ª., 2ª.,   3ª. e marcha-a-trás). Arnaldo Domingues, Gilberto Simão Domingues (filho), também da mesma marca,  Casa dos Ciprestes, marca Ford e João “Pedrinho”, marca Same, só apareceram uma década mais tarde e alguns até mais. Nos primeiros anos, o tractor do Sr. Manuel Barreira, foi sempre conduzido por pessoal da terra sem carta de condução. Recordamos aqui alguns tractoristas dessa época: Toninho Rôlo e filho Agenor, Luís Pereira, Mário Vergueira “da Clara”, Manuel Barrosão, entre outros.

Consta-se que nessa altura, alguns trabalhavam por vezes gratuitamente, só para conduzir o tractor. Hoje (2010) a nossa freguesia conta com perto de 80 tractores, mas  só metade dos terrenos é que estão cultivados,..!?.

Também com o aparecimento destas modernas máquinas agrícolas, começaram a ser encostadas, as foices, “seitouras”, como ainda continuam a ser conhecidas no meio rural e os “dedais”, de protecção dos dedos das mãos, utensílios, que serviam para ceifar o centeio. A “gadanha”, e o “corno”, que servia para pendurar ao cinto a pedra de afiar molhada, destinados a “segar” os fenos para os animais de trabalho, foram progressivamente encostados, não falando, é claro, nos muitos animais de trabalho que deixaram de existir depois do início da década de 1980.

Recordo aqui o nome de alguns bons “segadores” de feno dessa época que trabalhavam à jeira: Carlos “Bandalho”; Zé Lino; Albertinho Fernandes; Mariano “do Regodeiro”; Floriano Modesto; José Augusto Rodrigues, também conhecido por “Letras”; Amadeu Moreiras “Pedreiro”; Rocha do Pontão; Raul e Júlio Pereira; Alípio Fontoura, António Teixeira; Néné; António Modesto (Tenente); e Filipe do Nascimento, também conhecido por “Palheiras”, por ser especialista na arte de cegar e atar, entre outros.

Nas segadas dos fenos, havia sempre um que “picava” as gadanhas ao longo do dia de trabalho, para que cortassem melhor o feno.

Já quanto aos “segadores” de centeio, quase toda a gente sabia fazê-lo, sem bem que havia alguns melhores, quer a cegar, quer a atar, e que lideravam as camaradas de segadores que partiam todos os anos (já depois das nossas) para ceifas (segadas) de outras localidades próximas da nossa terra, e de outras de outros concelhos vizinhos, mais propriamente do distrito de Bragança, da denominada terra fria, à procura de trabalho para juntar mais alguns patacos/escudos para as despesas do ano.

Havia também outras camaradas de trabalhadores que partiam todos os anos (décadas de 1960 e início de 1970), nos meses de Setº., Outº., e Novº. e início de Dezembro, para o arranque das batatas na região do Minho, mais concretamente na zona da Serra da Boalhosa, do Concelho de Ponte de Lima. Em 1960/1962, o preço da jeira diária desse serviço era de 18 a 20 escudos (agora 09/0,10 €). Contou-nos o conterrâneo Luís Rua que em 1972/1973 tinha 19 ou 20 anos de idade, que o preço da jeira que lhe foi pago no “arranque”, foi de (+/-) 60 escudos (0,30 €).

Contaram-me também outros arrancadores, que a maioria, tinha que levar  de casa uma manta para dormir e um pote de ferro para fazer o comer, e que dormiam, ou em cabanais, ou em quartos ou lojas muito degradadas, a maioria sem o mínimo de condições. Os patrões só ofereciam simplesmente as batatas para comer. Os restantes alimentos e ingredientes eram comprados a cerca de 5 km de distância, onde, para o efeito, tinham que se deslocar a pé pelos montes ou por fracos caminhos trilhados pelas rodas dos carros de bois ou outros animais.

Alguns, entre muitos arrancadores da nossa aldeia de que me falaram terem ido para esse trabalho  vários anos: irmãos: Cesário Espiritosanto; Mário Vergueira “da Clara”, Augusto e Vicente; Joaquim Rito; Adriano Garcia da Mata; Raul Simplício; Fernando Barreto Fernandes (Babau); António Contins e filho Amândio; Artur Sá; Luís Rua, Fernando Pardal, Elias Vergueira; Luís Mata.

 

Primeiro Motor de Rega

Pertenceu a José Gonçalves “Feijão” do Br. do Pontão, pai de Artur “Feijão”. Foi comprado no ano de 1950 e tinha a marca “Lausun”. Contaram-me, que nas regas, antes de o pousar no chão para trabalhar, colocava por baixo dele, uma cortiça e ainda um saco em lona. Esta máquina, (moderna/novidade), de puxar a água, de polegada e meia, custou quatro mil escudos, (agora, 20 €), muito caro, (por ser enganado,  - disse-nos o filho Artur - ), só funcionava a gasolina e o preço do litro na altura era de dois escudos e cinquenta cêntimos.

Um, ou dois anos depois, José Ribeiro, Claudina Ribeiro, Alice Fernandes, vieram também a comprar, mas a trabalhar já a petróleo. No início da década de 1960, apareceram outros de marca “ Clinton” de: Francisco Rolo, Gualdino Nogueira, João “Pedrinho” e poucos mais, mas já muito mais baratos (mil e trezentos escudos). Os baldes dos poços, “cegonhas”, como são conhecidos, e os” garabanos”, começaram a ser encostados.

 

Última Junta de Bois de Trabalho:

A última junta de bois de trabalho, neste caso de vacas, a ser jungida (junguida) em St. Valha, pertenceu ao falecido Fernando Alberto de Castro, do Br. dos Ciprestes. No início da década de 1990, vendeu essa junta de vacas, por já não ter forças para dar continuidade a este método de trabalho artesanal e os filhos não lhe virem a dar continuidade. Tanto o carro de bois, como as alfaias e outros pequenos utensílios, jazem ao ar livre no pátio da sua casa em estado quase total de degradação. A penúltima “junta de vacas” de trabalho pertenceu à casa/família dos Parautas. Também a última parelha de burros a ser jungida (junguida) na nossa aldeia data da década de 80. Pertenceu a Artur Domingues Gonçalves, do Br. do Pontão, carinhosa e carinhosamente mais conhecido na aldeia  por “Artur Feijão ou Artur Bombinho”.

Das inúmeras juntas de bois de trabalho que havia outrora em toda a nossa freguesia, hoje em dia (2014) só existe uma, em Pardelinha, pertencente ao senhor Augusto Lopes, mas já pouco trabalho de lavoura faz no campo. Ouvi dizer que noutros tempos só em Pardelinha chegou a existir 12 juntas de bois de trabalho e sete rebanhos de gado.

 

Carro de Bois:

O carro de bois, ferramenta ancestral de trabalho da lavoura até há duas ou três décadas atrás, é composto pelas seguintes peças:

Chedeiro: PinalhoChavelhaChabelão ou Chavelhão; Estadulhos (5 de cada lado = 10); Travadoras dos Estadulhos (2); Ladranhos (2); Soalho; Travessas do Soalho; Treitouras (4); Cunhas das Treitouras; Coucões (2) e Eixo. Também os Cambos (2), um de cada lado, em madeira/pau de negrilho, destinados a travar os estadulhos, nos serviços da “acarreja” de fenos e palha. Ainda a argola em ferro num dos lados do carro que serve para pendurar a machada.

(Nas Chedas (2), era obrigatório em cada uma, possuir um reflector luminoso).

O Eixo era feito em madeira/pau de Freixo.

Rodas (madeira de Freixo): Meão (1) e Cambas (2 cada roda) em pau de amoreira, freixo ou negrilho; Relheiras (2) e Argolão em ferro em volta das rodas. Os Coucões, em madeira de Amieiro ou Negrilho. Estadulhos, de pau de Carvalho, e resto do carro, em madeira de negrilho. As Cambas, são os buracos redondos que existem nas rodas do carro. Peças Soltas ou Arreios:

Jugo, (de Carvalho ou Freixo) – Molidas (2) – Sogas (2) Tiras em couro, para prende as cabeças dos animais às molidas e ao jugo – Tamoeiro, tira mais grossa, larga e cumprida em couro de boi, para prender o carro na Chavelha e chavelhão ao jugo ou qualquer alfaia. Estas peças serviam para “Jungir os Bois”. Havia também a corda de prender, mais conhecida por laços, que servia para prender a mercadoria ao carro.

Os bois usavam coleiras de cabedal com campainhas de tocar, e um brinco nas orelhas, com o número de registo de animal de trabalho. Os nomes mais vulgarmente chamados ao bois e/ou vacas, eram os seguintes: Amarelo(a), Castanho(a), Preto(a) e, mochô(a), se porventura o animal tivesse a ponta de um corno partido. Havia sempre bastantes mais parelhas de vacas do que bois.

Quando havia algum acontecimento mais triste ou mais grave na aldeia os lavradores não deixavam as campainhas dos animais tocar em sinal de profunda solidariedade.

(No Jugo, era obrigatório possuir um reflector).

Charrua nr. CB2 – Arado – Agrade (grade) – Zorra: para mover as pedras de maior porte.

Cesta de Arame, para o colocar no focinho dos animais.

As Chavelhas (2), são umas peças em pão de freixo ou negrilho, presas nas Molidas (uma de cada lado) dos animais com uma corda, que vão engatar à charrua, no caso de se tratar de um só animal a puxar, é claro, sem ser de raça bovina, já que estes animais individuais, tinham que ter um  pequeno jugo e uma molida, com cordas a engatar/prender no balancim.

Agrade de madeira, destinada a agradar as terras lavradas. Normalmente era feita de pau de Sobreiro, Negrilho ou Freixo.

Zorra, destinada a mover ou transportar pedras. Normalmente era feita de pau de Sobreiro, Freixo ou Negrilho.

Dornas de “acarrar” as uvas: eram feitas de madeira de castanho ou carvalho. Também as canastras, barreleiros e vindimos, feitos de verga, para recolha de produtos da agricultura, eram transportados nos carros dos bois.

Tremoncela ouTamãocela: era uma peça móvel em madeira (pau de (+-) dois metros e meio de cumprimento e sete ou oito centímetros de largura) de ligação do jugo à charrua, à agrade ou à zorra.

 Soga: Tira de cabedal para fixar/apertar a molida aos cornos do boi.

Molida: Protecção para a cabeça dos bois, em cabedal, almofadado com palha onde assenta o jugo.

Nota: Em outras regiões a molida é conhecida por molhelha e o jugo, por canga.

Lavrador: Homem que lavrava a terra e que vivia do seu cultivo.

Criado: Empregado (já adulto) do lavrador. Paquete: Rapaz ajudante do lavrador e do criado. Normalmente os paquetes eram rapazes de idade muito jovem, cujos pais não tinham quaisquer recursos económicos e que trabalhavam só pelo sustento de alimentação e vestuário, sem bem que também havia alguns criados nessas condições.

 

Algumas Normas Regulamentares Obrigatórias do Lavrador até finais da década de 1970:

Aguilhada (vara de madeira), com ferrão metálico na ponta, destinada a guiar/dominar os animais. O “Ferrão”, tinha a forma cónica e o seu cumprimento não deveria exceder 4 milímetros (tamanho de (+-) um grão de trigo); a sua espessura na base, não poderia ser superior a 2 milímetros; o topo da vara deveria ser plano, e teria de ter a diâmetro mínimo de 1 centímetro.

O Eixo do carro não podia fazer barulho, mais precisamente “Chiar”. Normalmente só fazia esse barulho quando vinha muito carregado e no período de verão, como o calor. Quando acontecia, os lavradores colocavam sabão no eixo. Para além das Autoridades (GNR), os Cantoneiros das Estradas, tinham poderes conferidos para aplicar essa multa.

 

Multas das Autoridades (G.N.R.), de que nos recordamos:

Ferrão da Aguilhada: 150$00 (escudos), equivalente a 0,75 €. – Falta de Licença de Circulação (Chapa) do Carro: 150$00 – Chiar do Eixo do Carro e pisar a valeta da estrada: 150$00 – Falta de Reflector: 40$00, cada.

Também havia a multa de 150$00, por falta de cumprimento dos regulamentos de outros animais de trabalho, como, por exemplo: Celas, falta de guias (rédeas) para dirigir os animais, pessoas em cima dos carros, em vez de virem à frente a dirigir os animais. Ainda: licenças de todos os animais que circulassem em lugares públicos, incluindo rebanhos de gado e até mesmo uma ou outra ovelha ou cabra que circulasse sem ser acompanhada à rédea e falta de algumas campainhas ou chocalhos em certos animais etc.

 

Arado de Madeira:

Era composto pelas seguintes peças/apetrechos:

Maozeira ou Rabiça - Tamão/tamãocela – Relha - Ateiró – Aviacas (2) – Ameixilho ou Ferro para segurar as Aviacas .

A Rabiça era feita em madeira/pau  de Carvalho ou Freixo; Tamão e Tamãocela, em Negrilho ou Amieiro; Aviacas, em Amieiro. O Tamão e a Tamãocela, é uma peça/vara (grossa) em madeira que servia para prender o arado ou charrua ao jugo dos animais. No trabalho com um só animal, também se costumava chamar “varas do arado”.

 

Charrua de Madeira:

A Charrua (quando chegou) foi inicialmente conhecida e chamada de “Arado Americano”.

Peças:

Mãozeira – Tamão – Hastes (andorinhas ou ouvidos) com a roda e argolas em ferro – Aviaca e ferro que a segura – Ateiró – Passador: ferro que segura a Ateiró; Rasto e Relha, também em ferro, e o Balancim, peça em madeira ou ferro, que servia para o animal puxar a Charrua.

Nota: O “Arado” foi o primeiro instrumento de trabalhar a terra puxado por animais. Só muitos séculos mais tarde, chegou o Carro e a Charrua.

 

Cangalhas:

Armação colocada nos animais de trabalho (burros, machos e cavalos) por cima da albarda, geralmente feitas em madeira de pinho ou amieiro para se tornarem mais leves. As cangalhas serviam para os animais transportarem a carga de ambos os lados. O animal com as cangalhas era o principal meio de transporte da mercadoria para o monte dos mais pobres. As últimas que ainda existem na aldeia pertenceram a Germelindo Augusto Atanázio do bairro dos Ciprestes, mais conhecido por Augusto Polino, pai de João Atanázio, entre outros. Em Fevereiro de 2012 ainda foi possível tirar uma foto delas em cima de uma burra para colocar no Site.

Albarda:

A albarda é uma espécie de sela, mas bastante maior, normalmente feita de pano grosseiro e de algum couro e enchida de palha. Para a segurar no dorso dos animais de carga existe uma peça ligada à albarda, feita de várias correias de couro que é aplicada entre a albarda e a parte traseira (rabo) do animal, chamada de “atafais”. Para apertar a albarda ao animal existe outra peça de couro (tipo cinto), chamada de cilha.

 

Sementeiras, Ceifas e Malhadas:

Para semear os cerais, com a ajuda de animais, os trabalhos na terra eram feitos da seguinte forma faseada:

A terra, era “decruada” no mês Janeiro, “agradada” e “entravessada” nos meses de Maio e Junho, e semeada, nos meses de Setembro e Outubro.

“Embelga”: Delimitação de terrenos em corredores para a sementeira.

As “Ceifas ou Cegadas” eram, e, continuam a ser, durante todo o mês de Junho, assim como as “ Malhadas”, durante todo o mês de Julho.

O centeio era “ceifado/segado”, atado, e de seguida posto na terra em molhos numa roda para secar, com  a semente/espiga para cima. De seguida, também na terra onde foi cultivado, era “emborneirado”, em “borneiros”, espécie de pequeno “palheiro” de molhos. Passados alguns dias, quando já seco, era “acarrado ou “acarrejado”, pelos animais para a eira, posto em “meda”, para ser malhado.

Cada “carreto” de bois transportado para a “eira”, levada entre 15 a 20 “pousadas” de centeio, conforme a corpulência/porte dos animais, e a “pousada” era constituída por 5 molhos.

A “pousada” depois de malhada, normalmente dava um alqueire de centeio, pão, como vulgarmente ainda é hoje é conhecido.

Nunca foi tradição semear trigo na nossa aldeia, tendo em conta que a grande maioria dos terrenos de sementeira da nossa aldeia não são adequados para este género de cereal. O muito pouco que foi semeado, foi nas zonas mais baixas, nomeadamente na Coutada ou perto.

Ainda hoje (2013) ouvimos dizer aos mais idosos a seguinte frase: Para ser um bom ano de pão tem que cair três nevadas e um nevão.

As várias tarefas de trabalho do milho: Semear, sachar e chegar, cortar, descanar, desfolhar e debagar.

Também o seguinte para ser um bom ano agrícola: Dezembro: molhado; Janeiro: geadeiro; Fevereiro: casa sulco, seu ribeiro; Fevereiro quente traz o diabo no ventre; Março: marçagão, nem rabo-de-gato molhado e, Março: igualarço/magarço, a noite com o dia e o pão com o charguaço, iguala o dia à noite; Etc. Etc. Etc Abril: águas mil e quantas mais poderem vir. Pelo natal semeia o teu alhal, se o quiseres cabeçudo, semeia-o no Entrudo, etc.

Os pequenos e bastante antigos almanaques, “reportório” como o povo antigamente lhe chamava e que ainda hoje (2014) existem e de tiragem anual, tais como: Borda D` Água e o Seringador, eram na altura e ainda hoje são para alguns agricultores, um bom conselheiro da lavoura. Recorde-se, que o “SERINGADOR (T)”, - Reportório Crítico-Jocoso e Prognóstico -  foi fundado em 1865 por um nosso vizinho de Vilarandelo de nome João Manuel Fernandes Magalhães. Desde a morte do seu fundador passou a ser editado e da responsabilidade da Editora Lello.

 Ainda alguns rituais:

“ Deus te salve saco; Sete maquias te rapo; Uma por te levar; Outra por te trazer; ………; ……….; e outra pró burro comer”.

As crendices e superstições: não semear durante a lua cheia, não começar nenhum trabalho ao sábado, não executar certas tarefas em dias nebulosos.

 

Medidas de capacidade e peso que se utilizavam na  nossa freguesia:

Para líquidos: “Almude”: equivalia a 25 litros; “Cântaro”: 12,5 litros;  “Remia “: (+-) 6 litros; “Canada” 2 litros; “Meia Canada”: “1 litro; “Quartilho”: Meio litro: 0,5 litro; “Quarteirão”: 1/8 do litro e “Meio Quarteirão.”. Estas medidas eram utilizadas para medir o vinho, vinagre, aguardente, azeite, mel, leite, etc. Eram todas fabricadas em chapa.

Para sólidos: “Rasa”, “Meia - Rasa”, e o “Razão”. Eram medidas de capacidade dos cereais, chicharros, milho, feijão, castanhas, sementes, etc..  Na nossa freguesia a rasa equivale ao alqueire (12 quilos) e, a meia rasa, a meio alqueire. O razão, menos utilizado no nosso meio, equivale a 20 (?) litros e também se destinava a aferir o conjunto das várias medidas existentes, que tinha obrigatoriamente que dar no total o equivalente ao razão. Havia ainda a medida chamada por “Maquia”, mas esta, era mais utilizava pelos moleiros nos moinhos. Estas medidas, incluindo as de capacidade inferior a 1 kg, eram todas elas fabricadas em madeira.

Na nossa freguesia, a “Arroba”  é equivale a 15 quilos de peso. Era normalmente utilizada para negócio de compra e venda de palha, feno, figos, etc.

As balanças de ganchos com pesos de pedra eram utilizadas para pesar coisas de maior volume. Só mais tarde é que apareceram os pesos de ferro, as balanças de copas e de pêndulos. Ainda mais tarde, as balanças de pratos para pesar as pequenas coisas, tal como os pesos em “arrate(s)/Arrátel”, antigo peso de 16 onças, equivalente a 459 gramas, e ainda o peso em libras.  Só em meados do século XX (1950), é que começaram a aparecer as primeiras balanças decimais, fabricadas em madeira, e com pesos e hastes já em ferro, destinadas a pesar coisas de maior volume.

 

Alguns utensílios que serviam para ceifar/segar e outras palavras (rurais) que se utilizavam:

Foice: para ceifar/segar o centeio ou trigo – Dedais (de cabedal): destinados a proteger os dedos da foice/ceitoura. – Atar: apertar os molhos. – Granheira ou Vencelha : composta por um punhado de palhas cortadas com a espiga para apertar os molhos, em que era dado um nó de aperto especial com uma ou duas voltas, seguindo de fecho final, chamado de Chave à volta da granheira. – Pedra de afiar a foice. Sulco: rego do arado.

Para tornar os “dedais” que protegiam os dedos da mão mais macios, esfregavam-se com toucinho (carne gorda do porco).

Nas ceifas, um segador “homem” na seara (pão), normalmente ceifava/segava ao mesmo tempo três sulcos, e a mulher dois. Também havia a ceifa em que não havia sulcos na terra (terra agradada), esta, chamava-se “Segada à Talha “.

 

Ceifar o Feno a Gadanha:

O mês desta tarefa é Junho.

Utensílios utilizados: Gadanha - Pedra de afiar, colocada num “corno de boi” com água, para a pedra estar sempre molhada e afiar melhor a gadanha. O corno era pendurado no cinto do trabalhador. Ferros de picar a gadanha, compostos de Safra e Martelo.

Nas ceifas, vulgarmente eram conhecidas por segadas, os patrões davam de comer diariamente aos trabalhadores, conhecidos por segadores: Mata-bicho – Almoço – Merenda e Ceia. O vinho para beber era transportado pelos patrões em cabaças, que chegavam a levar até 1 almude, ou pequenos pipos de madeira de 5 a 10 litros, e até alguns transportado em odres.

Uma camarada de segadores era um conjunto de vários segadores de centeio ou trigo.

 

Malhada do Centeio a Malho:

Na eira, uma malhada a malhos, era normalmente feita por 12 homens, seis de cada lado.

O malho é composto pelas seguintes peças: Maniota, também conhecida por Mangueira ou Mangual, que é uma espécie de vara/pau de carvalho, onde os trabalhadores pegavam com as mãos no malho.  Pírtigo: pedaço de pau de sobreiro mais curto, que batia na palha de centeio para separar o grão da palha – Cidouro:  é uma correia de cabedal com forma arredondada que prende a maniota ao  pírtigo.

Antes de malhar, as pessoas varriam as pedras (fragas/lages) das eiras com vassouras de giesta e nas fendas das pedras, colocavam excrementos dos bois, mais conhecidos por “bosta”, não deixar perder o grão, que depois de seca, era autêntico cimento.

Ainda hoje, algumas pessoas mais idosas costumam dizer o seguinte, ao se despedirem de alguém conhecido ou amigo: adeus e até à borrada das eiras; que queria dizer: até pr’a o ano.

O grão de centeio ou trigo, era limpo por uma máquina ventiladora movida (tocada) manualmente, conhecida por Tarara.

Após essa tarefa, o grão era transportado pelos animais para casa e armazenado em enormes caixas de madeira, normalmente feitas em madeira de castanho a que chamavam de tulha ou tulhão, algumas levando mesmo mais de 100 alqueires de cereal. Havia algumas fabricadas em madeira de pinho de árvores de grande porte, como por exemplo: uma que ainda existe na casa dos herdeiros de Benjamim Picamilho, fabricada com madeira do célebre tronco do soberbo e muito falado “pinheiro manso ou pinheiro grande”, que existiu até 15 de Fevereiro de 1941 (ano do grande ciclone) na curva da estrada para Pardelinha que lhe deu o mesmo nome, propriedade de outros tempos da Casa Paroquial/Abadia, conhecida pela Cerca. Também ouvimos dizer que ainda existe actualmente (2013) outra caixa ou tulhão propriedade de Paulo Jorge Teixeira do bairro do Sobreiró e que pertenceu antigamente ao Professor Carolino Augusto Afonso que servia de armazenamento de cereal no lugar da antiga moagem no bairro dos Ciprestes, trocada por trabalho de carpintaria. Das bastantes que existiram antigamente na casa dos proprietários lavradores mais abastados, tudo indica que só restem hoje (2013) para museu e contos dessas memórias, duas em Stª. Valha.

Nas malhadas com malhadeiras, a palha com o centeio entrava manualmente na máquina e saia já dividida: palha, grão, e coanho, que são detritos da palha. Era feito  um palheiro na eira, coberto com a própria palha, que depois de ripada à mão, servia para os animais e outros serviços durante o ano inteiro. Essa palha era transportada para o palheiro às costas dos homens, chamada de vergada , e quando o palheiro já estava com certa altura, tinham que subir umas escadas com muita dificuldade dado o vulto e o peso transportado.

Algumas medas, palheiros da palha e do feno nas eiras, eram autênticas obras de arte. Recordo aqui alguns bons mestres:  João Fernandes “Contins”,José Fontoura “Nabo”, José Feijão, Crizando, Toninho da Aurélia, Celestino Domingues “Néné”, Augusto “Letras”, Germelindo Atanázio, António Rocha, António Modesto “Tenente”, Artur Feijão, Rui Teixeira Neves, entre outros, mas houve dois que se destacaram, entre todos estes, acima de tudo pelo orgulho na arquitectura: João Contins, José Fontoura “Nabo” e Celestino  “Nené”. Estes dois chegavam a bater a palha da roda do palheiro com uma tábua para ficar mais vistoso, e o funil do fecho ou serrar, com uma argola de enfeite.

 Numa malhada com malhadeira, eram necessárias no mínimo 10 pessoas para executar essa tarefa, dependia sempre da quantidade de pousadas da meda.

Eiras “públicas ou comunitárias” mais importantes: Eira das Lages, no Br. do Pontão, matriz predial rústica propriedade da Junta de Freguesia; Eira do Br. de Stª. Maria Madalena, no lugar agora da cabine telefónica dos CTT; Eira do largo do Br. dos Ciprestes, junto à casa de Heitor Tender, entre outros; Eira do (largo) Sobreiró; Eira da Cabana; Eira da Cinzeira ou Entre-as-Águas e eiras (2) da Coutada, se bem que estas (2) últimas não se podem considerar públicas ou comunitárias, visto pertencerem ainda aos herdeiros do “Cego das Casas da Coutada”. Havia ainda muitas particulares, e até alguns lavradores que malhavam o cereal nos pátios das suas habitações.

Havia algumas pessoas, que até final da década de 1970, face à necessidade, se dedicavam à apanha do Cornizó, pouco antes das ceifas, que é um fungo do centeio, de cor preta, que existia na espiga depois de seca, que diziam ser usado para fabrico de armamento e/ou artigos farmacêuticos.

 

Culturas Agrícolas:

As duas principais culturas agrícolas de sustento e negócio dos nossos agricultores/lavradores que sempre existiram na nossa freguesia foram e, continuam a ser hoje em dia, o vinho e o azeite. Nesta última década também o mel.

Existiram certamente outras também prósperas, mas que hoje em dia (2013) têm muito pouca expressão para o nosso desenvolvimento rural e que os nossos agricultores continuam a persistir semear ou plantar, mais para consumo próprio, chamada hoje de agricultura de subsistência, como, por exemplo:  cereal de centeio, batata, milho, Xixarros, frutas diversas, etc, e alguma (muito pouca) castanha.

Por conseguinte, as frutas de excelente qualidade, dum também excelente micro-clima como o nosso que existem, actualmente pouca ou nenhuma expressão têm no mercado agrícola da freguesia, tendo em conta que não existe quem as compre ou comercialize.

Em meados da década de 70 do século XX (1970), apareceram duas culturas agrícolas na nossa terra que prometeram “animar” os proveitos agrícolas dos nossos agricultores, foram elas, a cultura do espargo e da amêndoa. Houve nessa altura um proprietário agrícola que investiu com alguma expressão nessas duas culturas, foi ele, Manuel do Nascimento Barreira.

A cultura do espargo, foi a primeira a ser abandonada e só durou um ou dois anos. A cultura da amêndoa, desde essa data até há de hoje, foi progressivamente perdendo o interesse do investimento dos nossos agricultores, atendendo à actual política agrícola da Comunidade Europeia em que estamos inseridos. Não entendo bem esta situação, tendo em conta que o Continente Europeu nunca foi auto-suficiente, quer neste em particular, quer em muitos outros frutos secos.

Cultura do Linho e da Seda:

Até às décadas de 1940 ou 1950, a cultura familiar e artesanal do linho e da seda fazia também parte da lavoura do nosso povo. Chegou a haver em Santa Valha e anexa do Gorgoço vários teares artesanais, principalmente do linho. Ouvi dizer, que há um ou dois séculos atrás, no dia da festa anual do padroeiro do Gorgoço, era costume realizar-se uma feira, mas que só durava quatro horas e que um dos artigos mais transaccionados estava relacionado a cultura e transformação do linho.

Colmeais ou Silhas dos Ursos.

Existem ainda nos nossos montes, nomeadamente no Semuro, Olguinhas ou Carqueijal, algumas estruturas que noutros tempos protegeram as colmeias e o mel, dos ataques gulosos do urso silvestre, que abundou na nossa região até ao início do século XIX, com maior abundância nas zonas de serra mais altas.

Os colmeais, apiários, alvarizas, popularmente conhecidas de silhas dos ursos são construções rudimentares em granito, de formato circular e fechada, que se encontram dispostas nas encostas. Estas construções do século XVII denunciam testemunhos de outros tempos, de outras gentes e de outras feras. Existem ainda mais dois colmeais ou silhas do género próximos de Santa valha que ficam localizados: um, bastante grande, no cimo do regato do Sandim (Carambelo), mais próximo da aldeia de Monte de Arcas e, um outro, no Casticeiral da Coca, logo a seguir ao Seixal e não muito longe da estrada, talvez já em território de Barreiros. Havia outros nos montes, mas foram destruídos (por larápios) no roubo de pedra. Tinham todos uma árvore dentro do colmeal ou encostada no exterior do muro destinada a enxamear as abelhas.

Estas construções, com cerca de sessenta centímetros de largura e um metro e meio a dois metros de altura, para além da principal função a que se destinavam, também ajudariam a prevenir algum eventual incêndio nos cortiços e abelhas, coisa que nessa época muito raramente acontecia nos nossos montes

No meu entender, estes ou esses chamados “Colmeiais”, deveriam sim chamar-se de “Cortiçais”, tendo então em conta que nesse tempo e até meados do século XX, no nosso meio só existiam cortiços feitos da cortiça dos pés dos sobreiros e não construídos de madeira, como são feitas as actualmente as colmeias. Quem estiver na estrada, mais propriamente na chamada curva da Marcelina, poderá ver ao longe o “colmeal” do Semuro, propriedade dos herdeiros de Manuel do Nascimento Barreira e esposa Margarida Silva. Muito perto encontra-se outro, mas mais pequeno, que fica do lado esquerdo do regato, propriedade dos herdeiros de Alice Fernandes Neves, mãe de Rui Neves, entre outros). O das “Olguinhas”, do lado direito do regato, tudo indica que possa pertencer à família Videira.

Santa Valha, 01-03-2011

(Última actualização em 01 de Março de 2015)