Coisas da história da nossa terra:

 

 

 

   O que nos dizem as Inquirições de 1258 - Parte I

 

         (Publicação: Blog: Clube de História de Valpaços – Leonel Salvado – 15-03-2013)

 

   

O Castelo de Monforte de Rio Livre, rara gravura de autor desconhecido, presumivelmente dos finais do séc. XIX

Cortesia de Pedro Verdelho in Cadernos de Viagem*

 

O CONCELHO DE VALPAÇOS E OS JULGADOS MEDIEVAIS DE RIO LIVRE E MONTENEGRO


INTRODUÇÃO

 

É ponto assente que o concelho de Valpaços se foi estruturando e moldando durante cerca de seis décadas através de conhecidos decretos reformistas de sucessivos ministérios liberais até adquirir a estrutura e fisionomia que hoje tem, isto é desde o decreto de 6 de Novembro de 1836 saído do ministério setembrista de Manuel da Silva Passos (Passos Manuel) que elevou a discreta paróquia à categoria de Município até à reintegração definitiva das freguesias de Curros e Vales em 1896. Existe ainda uma generalizada percepção de que a expansão do concelho de Valpaços resultou da gradual desagregação do quadro administrativo do “Antigo Regime” que no distrito de Vila Real, institucionalizado em 1853, deu lugar a uma nova organização municipal constituída por 14 concelhos, os mesmos que o compõem hoje. A extinção, nesse ano, dos concelhos de Monforte de Rio Livre e de Carrazedo de Montenegro proporcionou a transferência de uma parte das freguesias do termo daquele e da totalidade das deste, sendo que já em 1837 havia cabido a mesma sorte a algumas paróquias até então pertencentes ao termo de Chaves.

Recuando no tempo, também se sabe que aqueles concelhos de Monforte de Rio Livre e de Carrazedo de Montenegro foram formalmente instituídos em 1273 e em 1301, por cartas de foral de D. Afonso III e D. Dinis, respectivamente; que a precedência da criação do concelho de Chaves, instituída igualmente por aquele primeiro monarca em 1258 e para cujo termo e julgado passaram as terras medievais de Montenegro, pesou sempre na consciência do “Rei Trovador” que repetidamente decidiu em favor dos flavienses contra as pretensões dos homens de “Vila Boa de Montenegro”, pelo que apenas no início do século XIX o concelho de Carrazedo de Montenegro se constituiu de facto; contudo, de efémera duração!

Recuando ainda mais no tempo, na senda dos antecedentes históricos do concelho de Valpaços, a visão dos factos torna-se menos clara devido à escassez de documentos e à natural falta de memória dos homens irremediavelmente perdida na voragem dos tempos.

Qual era, nos primórdios da nacionalidade a estrutura administrativa na qual se integravam os espaço que hoje compõem o concelho de Valpaços?

Que igrejas, paróquias e povoados persistiram até aos nossos dias nos mesmos espaços e a que época poderão remontar?

Quem eram os patronos dessas igrejas, os senhores das terras, de que estatuto social gozavam e como se chamavam?

Que direitos tinham os reis sobre todos esses bens?

As inquirições (inquéritos mandados proceder desde cedo pelos monarcas portugueses para se apurar sobre o estado do património da coroa com particular incidência nas regiões em que se suspeitava haver violentas usurpações e desrespeito dos direitos reais) fornecem-nos úteis indicadores para podermos responder às questões atrás enunciadas. As mais valiosas para a nossa região de Trás-os-Montes são, sem sombra de dúvida, as que foram ordenadas por D. Afonso III em 1258, cujas actas foram publicadas, em latim, nos ”Portugaliae Munumenta Histórica”, contendo referências cronológicas acrescidas relativamente aos vários julgados, e por D. Dinis em 1290, acessível já na língua portuguesa na colecção "Leitura Nova" no "Livro 3 das Inquirições de Entre Beira e Além Douro" transcrita no reinado de D. Manuel.

Nesta PRIMEIRA PARTE é divulgada uma triagem do primeiro corpo documental referido, numa versão do autor, traduzida do latim para uma leitura actualizada, mantendo-se as designações das circunscrições (julgados e paróquias), bem como alguns topónimos e antropónimos na versão latina original. Numa SEGUNDA PARTE será divulgado um trabalho de organização e sistematização de informações do documento com anotações aduzidas pelo mesmo autor com o subtítulo “AS IGREJAS, AS TERRAS E OS SENHORES DELAS NOS JULGADOS MEDIEVAIS DE RIO LIVRE E MONTENEGRO EM 1258”.

 

INQUIRIÇÕES GERAIS DE D. AFONSO III 1258 – QUARTA ALÇADA

 

JULGADO DE RIO LIVRE

 

Incipit Judicatum de Rio Liure ij. Die januarij Era M. ª CC.ª Lxª vij.ª –

 

(PARÓQUIA DE SANTA VALHA)

 

Imcipit parrochia de Santala,-

 

- Menendus Fernandj, prelado da mesma igreja, jurado e interrogado se o Rei é patrono da mesma igreja disse que não sabia.

E disse que a villa é toda foreira ao Rei e a mesma igreja fica na herdade foreira e os homens da villa que são foreiros abadam a igreja por costume. E disse que a igreja não tem herdamentos foreiros ao rei. E disse que o arcebispo bracarense leva dela cinco modios de pão desde o tempo do arcebispo Donnj Stephani. (arceb. Estevão Soares da Silva 1212-1228?)

 

- Petrus Garsia de Santala, jurado e interrogado, disse que sabe que a villa é toda foreira ao rei e a mesma igreja fica na herdade “Domini Regi”e os homens da mesma villa, que são foreiros, abadam-na por costume. E disse que a mesma igreja detém herdamentos foreiros da mesma villa que lhe deixaram os homens por suas almas, no tempo deste rei (D. Afonso III) e de seu irmão o rei D. Sancho e não fazem daí foro régio, mas fazem aí o foro que ficou na herança deles dos herdamentos deixados à supracitada igreja. E disse que sabe que Petrus Menendij tem na mesma villa um casal e não faz dele foro; interrogado de onde o obteve, disse que de seu pai. E sabe que Santa Maria de Rocamador tem na mesma villa dois casais que deixaram homens da mesma villa, foreiros, por suas almas e não fazem daí foro régio; interrogado desde quando, disse que desde o tempo do rei D. Sancho, o velho.

 

E sabe que a villa de Eruones foi “foraria Domini Regi” e a igreja de Eruones está em herdamento foreiro. E sabe que pousavam aí Ricos-Homens que tinham terras nessa villa e davam-lhe os homems “uidam” uma vez ao ano e faziam-lhe serviço da dita igreja e peitavam voz e coima. E agora tem a mesma villa Donnus Alfonsus Lopiz por razão do Ospitale que lhe deu a igreja; interrogado de onde obteve o Ospitale a mesma igreja disse que a obteve dos mesmos homens foreiros da villa que a deram a Donno Laurencio Nuniz por ajuda que a eles fez no tempo do rei D. Sancho, irmão deste rei (D. Af.ª III) e disse que os homens da mesma villa defenderam esta doação quando a concederam a Donno Laurencio Nuniz e não fazem daí foro régio.

 

E ouviu dizer a homens que sabiam que Albergaria e aldeola de ponte de Domente foram do Rei e que o rei doara a mesma aldeolam Albergarie ed ponte por sua alma e agora Donnus Alfonsus Lopiz e cavaleiros “bragancianos” fiharam a mesma aldeolam e a mesma Albergariam porque deixaram aí a Donnus Garcia Petri seus avós 2 casais e agora não fazem daí as esmolas que o rei mandou fazer nem fazem foro régio.

 

E sabe que que Petrus Laurencij comprou um casal foreiro em Leas (Feannes?) no tempo do rei D. Sancho, irmão deste rei, e não faz daí foro régio.

 

E sabe que o herdamento que Rodericus Laurencij, cavaleiro, tem na villa de Barreiros foi foreira ao Rei e que a obteve de Donnus Garsie Petri e o mesmo Rodericus Laurencij não faz daí foro régio. E sabe que o supradito Petrus Laurencij, cavaleiro, comprou um herdamento foreiro do “Domini Regis” em Felmir e não faz daí foro régio.

E ouviu dizer a homens que sabiam que a villa que chamam Ousezares foi toda regalenga régia e agora não tem nela o rei mais do que a terça parte e as duas partes tem-nas Petrus Laurencij e “suas fraternitas” e nada nestas tem o rei.

 

E disse que sabe que Laurencius Roderici levou uma herdamento foreiro ao rei de um homem de Santala por coima que fez quando detinha a terra no tempo do rei D. Sancho, irmão deste rei, e agora a tem o filho de Laurencio Roderici e não faz daí foro “Domino Regi”.

 

- Tome Laurencij de Santaala, jurado e interrogado, disse em tudo como Petrus Garsie, excepto da villa de Eruones que disse que não sabia nem migalha.

 

- Petrus Menendi, cavaleiro de Santaala, jurado e interrogado, disse em tudo como Petrus Garsie, excepto do casal que Petrus Laurencij comprou em Feanes que nada disso sabia.

 

- Bazeiro Garsie de Santaala, jurado e interrogado, disse tal como Petrus Garsie menos da Albergariam e aldeolam de ponte de Domente de que nada sabia. E disse, em vez disso, que ouviu dizer de homens que a villa de Ouzezares (Oucidres) foi toda regalenga e que o concelho de Rio Liure deu a metade a Petro Laurencij, cavaleiro, e agora têm Petrus Laurencij (o mesmo) e seu irmão as duas partes e não fazem delas foro “Domino Regi”.

 

- Petrus Fernandi de Santaala, jurado e interrogado, disse que sabe como Petrus Garsie, excepto do casal de Feanes e do herdamento de Felmir que comprou Petrus Laurencij e da aldeolam de ponte Domente e da albergariam, que nada disso sabia.

 

- Petrus Roderici de Santaala, jurado e interrogado sobre a villa de Santaala e da igreja e do herdamento foreiro que a igreja detém e de há quanto tempo a detém ela e do casal foreiro que adquiriu Petrus Laurencij em Feanes, disse tal como Petro Garsie.

E sabe mais que Petrus Laurencij, cavaleiro, deu a nutrir um seu filho no herdamento foreiro régio de Felmir e outro seu filho no herdamento foreiro de Feanes e Rodericus Laurencij deu um outro seu filho no herdamento foreiro de Castineyra e deram-nos para criar no tempo deste rei (D. Afonso III), em prejuízo “Domino Regi” e do seu séquito.

 

- Petrus Petri de Santaala, jurado e interrogado a respeito da mesma igreja e da mesma villa e do herdamento que detém a igreja e do herdamento foreiro ao rei de Santaala que levou Laurencius Rodericj de um homem foreiro por coima que fez, disse tal como Petrus Garsie.

 

 

  O que nos dizem as Inquirições de 1258 – Parte II

           (Publicação: Blog:Clube de História de Valpaços – Leonel Salvado – 17-03-2013)

 

Introdução

RIO LIVRE E MONTENEGRO. Nestes dois julgados medievais instituídos nove anos depois das inquirições que aqui tratamos mas devidamente assinaladas nas respectivas actas, radica a parte mais substancial da história do concelho territorial administrativo de Valpaços. Os cerca de 160 anos de simbiose cultural e institucional do concelho de Valpaços já percorridos desde a fusão da quase totalidade do extinto concelho de Carrazedo de Montenegro e do quadrante setentrional do de Monforte de Rio Livre, extinto pela mesma data e por força do mesmo decreto e, entretanto, também com porção das terras do antigo termo do concelho de Chaves, foram encobrindo uma realidade histórica que as inquirições de 1258 nos revelam – o quão diferentes eram os referidos julgados medievais que naquela data envolviam a grande Maria das terras do actual concelho.

Os contrastes entre estas duas regiões abrangidas pela “quarta alçada”, prendem-se tanto com a realidade política (a poder real, o peso das instituições, das normas jurídicas face à tradição), como com a realidade social, do quotidiano e das vivências sociais que as inquirições de 1258 revelam de forma clara e surpreendente.

À dramática desordem e instabilidade que vinham experimentando os povos do território que veio constituir o julgado de Rio Livre, desde o início da nacionalidade mas com especial recrudescimento durante o desastroso reinado de D. Sancho II, sujeitando-se à ambição e ignomínia de turbas de cavaleiros de distintas estirpes que se aliavam com o propósito de usurparem tudo quanto podiam, fossem terras ou igrejas, contrapunha-se a maior serenidade do ambiente em que viviam as comunidades integradas no julgado de Montenegro.

 

Do julgado de Rio Livre deixaram os respectivos jurados nas inquirições de 1258 inflamadas denúncias – sobretudo dos que se reportaram ao que sucedia nas paróquias de Santaala (Santa Valha) Santa Maria de Riparia (Bouçoais) e São Miguel de Fiães – sobre os temíveis cavaleiros conhecidos pelo nome de “togeyros” e outros da progenie dos Laurenci, seguindo todos eles os abomináveis exemplos dos respectivos patriarcas, Petrus Togeyro e Laurencio Roderici. Estes eram os principais próceres das terras de Rio Livre, pretensos nobres “sem Dom”, mas que se arrogavam por alegada dignidade social ao senhorio das terras, onde, uma vez instalados, levavam dos pobres herdadores - que até aí guardavam os foros ao rei - os seus haveres, por via da extorsão na forma de supostas coimas e deixavam nessas terras a sua prole a nutrir e a criar, à revelia dos direitos da coroa e perante a indignação que transparece das declarações prestadas por alguns prelados e Homens-Bons que serviram de testemunha. O Estado de incúria e o sentimento de impunidade que se alastrou por estas terras chegaram ao ponto de alguns clérigos cometerem iguais desmandos adquirindo por herança familiar herdades foreiras à coroa de que se escusavam de fazer o devido foro.

 

Do julgado de Montenegro pronunciaram-se os jurados das várias terras relativamente aos respectivos senhores e patronos com maior reverência, ainda que não se coibissem de denunciar a generalizada situação de incumprimento do foro régio em que incorriam muitos dos legítmos herdeiros e dos casos de clara usurpação e abusos de poder que aí também se cometiam desde o conturbado reinado de D. Sancho II. É dos depoimentos dos jurados deste julgado que se encontram as melhores confirmações de posse legítima das terras e dos padroados das igrejas, ressaltando amiúde a existência de “cartas de foro” ou de “cartas de quitação de foro” e da legitimidade das heranças, avultando neste sentido a expressão “de suo auoengo”, que visam exprimir a honrosa e insuspeita declaração de direitos herdados dos antepassados. As progénies nomeadas referem-se a figuras da Alta Nobreza, de antigas e prestigiosas linhagens algumas das quais remontam à época pré-nacional, leia-se condal-portucalense, e aos primevos anos da nacionalidade, de que apenas destacaremos as dos “Bragançãos” dos “Sousãos” e de “Chacim”, parecendo-nos estar esta, de alguma forma, relacionada com a primeira. Dos mesmos depoimentos referentes a uma plêiade de Ricos-Homens, com o atributo de “Domnus” que abaixo apresentamos, em poder de cujos herdeiros andavam os padroados das igrejas de Montenegro e as respectivas terras por honra, fica a ideia de que, ao contrário do que vinha sucedendo nas terras de Rio Livre onde não de descortina nenhum exemplo minimamente comparável, os direitos reais e senhoriais instituídos nos tempos das “presúrias” eram ali na maioria dos casos preservados e respeitados.

 

Não será portanto de surpreender, em face de tais contrastes entre estes dois territórios, não obstante a contiguidade no espaço, o evidente dualismo que revelam os subsequentes procedimentos adoptados por D. Afonso III e D. Dinis nesta região. Como se vê pela própria letra das posteriores inquirições de 1290, ordenadas pelo Rei Trovador, todo o antigo julgado de Rio Livre - “desque momforte foy pobrado tam bem nas herdades dos filhos dalgo com em nas outras todas” – foi considerado devasso, “provando-se” que aí já entrava “o moordomo” e “todos (peitavam) vooz e cooima”, ao passo que que nas terras do julgado de Montenegro, entretanto integradas no termo e julgado de Chaves, consentiu o mesmo rei que muitos dos honrados privilégios de certos “filhos dalgo”, bem como os de outras instituições estivessem como estavam, sabendo “elRey mais dos priuilegios” (deles).

 

 

AS IGREJAS, AS TERRAS E OS SENHORES DELAS NOS JULGADOS MEDIEVAIS DE RIO LIVRE E MONTENEGRO EM 1258

Organização e sistematização do teor das inquirições

  

INSTITUIÇÕES, PESSOAS, BENS E PRIVILÉGIOS

Segundo o teor das inquirições

(JULGADOS)

 

Arcebispado de Braga

(RIO LIVRE)

Igreja de Santaala (SANTA VALHA): a mitra bracarense levava dela 5 “modios” de pão desde o arcebispo Donnj Stephani (D. Estevão Soares da Silva, 1213-1228).

Igreja de Sancte Maria de Riparia (BOUÇOAIS): o arcebispo levava dela um quinhão da colheita da qual se sustentava “e não mais porque foi feita de tempo antigo” (antes do reinado de D. Sancho II).

Igreja de Sancte Maria de Tiela (TINHELA): “o arcebispo não leva daí mais do que 2 soldos de censória” (com herdamentos foreiros ao rei desde o reinado de D. Afonso II).

 

(MONTENEGRO)

A metade da villa de Sobreimares (act. freg. SANTA MARIA DE ÉMERES) então na paróquia de Sancti Nicholay de Carrazedo (São Nicolau de Carrazedo de Montenegro).

A quarta parte da villa de Sauto, então na paróquia de Sancto Jacobi de Alariz (SANTIAGO DA RIBEIRA DE ALHARIZ).

A Igreja de Sancte Columba de Monte Orelam, (VALES), do padroado real, e as “villas” de Vales e Zebras (cf. carta de couto de D. Afonso Henriques e Dona Teresa outorgada a Egea Menedij Rumbeo), filhada pelo arcebispo de Braga “que enviou para aí seus clérigos”.*

A igreja e paróquia de Sancte Maria de Taazindi (Santa Maria de Tazém), pelo menos até ao século XIII.**

 

Notas: a escassez de informações relativas ao padroado da mitra bracarense resulta, como é evidente, do espírito e propósito essencial das Inquirições: indagar prioritariamente de tudo aquilo que respeita aos direitos da coroa, isto é das igrejas do padroado real e dos herdamentos foreiros ao rei. Ainda assim alguns jurados dos julgados de Rio Livre e de Montenegro entenderam deixar as informações que ao lado se apresentam. *cf., em contrapartida, carta de excomunhão de D. João Peculiar com refência à “albergariam que est ad radicem montis Aureliani cum tota villa sua et cum tota eclesia sua”. **Nada se diz nas inquirições do poder do arcebispado de Braga nesta paróquia, mas sabe-se por outras fontes que se abriu no século XIII acesa disputa entre a Ordem do Hospital e a Mitra bracarense da qual levaram a melhor os hospitalários que a trouxeram doravante por igreja anexa a de São João Da Corveira.

  

Santa Maria de Rocamador (RIO LIVRE)

Na villa de Santaala (SANTA VALHA): dois casais que deixaram a Santa Maria de Rocamador os homens foreiros ao Rei por suas almas.

 

Notas: Sabe-se pelas Inquirições de 1290 ordenada por D, Dinis que esta congregação também já possuía, por esse tempo, bens na paróquia de São Mamede de Argeriz, nesta aldeia e nas de Crasto, Sanfins, Midões e Pereiro, para cujo granjeio terá certamente contribuído o facto de as terras de MONTENEGRO terem sido, entretanto, integradas no termo e julgado de Chaves, havendo nesta vila uma importante Casa da mesma congregação.

 

 

Eclesia de Santaala (RIO LIVRE)

Igreja de Santaala (SANTA VALHA): paróquia de remota fundação, do início da nacionalidade ou anterior (referência nestas inquirições: D. Sancho I), do padroado da mitra bracarense, como pelo menos assim aparece referenciada relativamente ao século XIII.* Esta villa foreira ao rei não escapou aos actos de extorsão e usurpação que alguns senhores da nobreza vinham cometendo nestas terras, desde os tempos de D. Sancho I contra os vilãos herdadores que guardavam os foros da Coroa**.

 

Jurado - Menendus Fernandj, prelado desta igreja: - A villa é toda foreira ao Rei e a igreja edificada em herdamento foreiro. Os homens da villa, que são foreiros, abadam a igreja por costume. A igreja não tem herdamentos foreiros ao rei. O arcebispo bracarense leva dela cinco modios de pão desde o tempo do arcebispo Donnj Stephani.

 

Jurado – Petrus Garsia de Santala: - A villa é toda foreira ao rei e a mesma igreja fica na herdade “Domini Regi”e os homens da mesma villa que são foreiros a abadam por costume. A mesma igreja detém herdamentos foreiros da mesma villa que lhe deixaram os homens por suas almas (desde o reinado de D. Sancho II) e não fazem daí foro régio, mas fazem aí o foro do que lhes restou da herança deles. Petrus Menendij tem na mesma villa um casal que ficou de seu pai e não faz dele foro ao rei. Santa Maria de Rocamador tem na mesma villa 2 casais que deixaram homens da mesma villa, foreiros, por suas almas no tempo do rei D. Sancho I. (…) Laurencius Roderici levou uma herdamento foreiro ao rei de um homem de Santala por coima que fez quando detinha a terra no tempo do rei D. Sancho, irmão deste rei, e agora a tem o filho de Laurencio Roderici e não faz daí foro “Domino Regi”.

 

Notas: *Estranhamente não existem referências a topónimos que nos permitam associar aos actuais lugares anexos da Freguesia de Santa Valha, Corgoço, Pardelinha, Calvo e Teixugueira. Os jurados eram, aliás, todos de Santala, ao contrário do sucedeu na grande maioria das restantes paróquias. **Queixavam-se alguns jurados da paróquia de Santala da má prática de alguns Senhores cometiam ao deixarem seus filhos a nutrir e a criar em terras foreiras ao rei pelas paróquias circunvizinhas, práticas esta consideradas tão danosas aos direitos do rei e seu séquito como o facto de aí não se fazer o foro ao rei como cumpria. Dentre tais próceres destacavam-se os irmãos Laurencij, cavaleiros, (certamente Bragançãos), como Petrus, Rodericus e Roy; o primeiro deixou um filho a criar em herdamento foreiro ao rei de Felmir (FELMIR, paróquia de S. Maria de Riparia) e em Feanes (FIÃES): o segundo fez o mesmo nesta villa de Santa Valha e na de Castineyra (CASTANHEIRA).

 

Eclesia Sancti Johanne de Eruones (MONTENEGRO)

Igreja de São João de Ervões (ERVÕES): fundada no início da nacionalidade em herdamentos foreiros à coroa; sufragâneas: 1 ermida em Villarino (VILARINHO DO MONTE).

 

Jurado - Stephanus Martinij de Tiela (Tinhela): - A villa de Eruones era foreira ao rei e a mesma igreja de Eruones foi edificada em herdamento foreiro ao rei e os homens foreiros a concederam a Donnus Alfonsus Lopiz e agora Alfonsus Lopiz tem a mesma villa e igreja.

 

Jurado - Rodericus Pelagij de Vasali (Vassal): - Avilla de Eruones foi foreira “Domini Regis” e a igreja está agora na mesma villa que foi foreira. Os homens da mesma villa litigaram com um cavaleiro de Donno Petro Garsie e os mesmos homens concederam essa igreja “in abadengo” a um freire que os ajudou contra Donno Petro Garsie e uma parte dos mesmos homens defendiam a mesma igreja e faziam o foro tal como o da mesma villa. E agora as tem Donnus Alfonsus Lopiz e nada aí tem o Rei.

 

Jurado - Petrus Garsia de Santala (Santa Valha): - A villa de Eruones foi “foraria Domini Regi” e a igreja de Eruones está em herdamento foreiro E agora tem a mesma villa Donnus Alfonsus Lopiz por razão do Ospitale que lhe deu a igreja; O Ospitale obteve a igreja de homens foreiros da villa que a deram a Donno Laurencio Nuniz por ajuda que a eles fez no tempo do irmão deste rei (D. Sancho II).

 

BENS: 2 casais foreiros ao rei em Valongo (VALONGO) que legaram os homens por suas almas; a 4ª parte do herdamento foreiro da villa de Saa (SÁ), doado por Johannes de Saa (no reindo de D. Sancho II), ainda que ao tempo destas inquirições alguns vilãos herdadores fizessem uma parte do foro não ao rei mas aos filhos de Laurencio Roderici* do que este tivera na mesma villa; herdamentos foreiros ao rei em Villar de Auro (VILAR DE OURO) que lhe deixaram os herdadores por suas almas;

 

*Este nome de Laurencio Roderici afigura-se nas Inquirições de 1258 como do mais remoto Senhor da villa de Sá, certamente já ao tempo de D. Afonso II. Há por outro lado referências a um avô dos filhos deste que terá recebido ainda antes a villa de Alpande que aqueles detinham no reinado de D. Afonso III.

 

Laurencio Roderici (MONTENEGRO E RIO LIVRE)

Influente cavaleiro que já andaria pelas terras do julgado de Rio Livre nos tempos do reinado de D. Afonso II, pelo menos, é recordado no reinado de D. Afonso III pelos jurados destas inquirições nos julgados medievais de Montenegro e sobretudo de Rio Livre como p patriarca de uma família de fidalgos, provavelmente da estirpe dos Bragançãos, trapaceiros e usurpadores que se fizeram notar no conturbado reinado de D. Sancho II*.

No tempo deste monarca o vasto património que Laurencio Roderici acumulara nos referidos julgados já houvera sido repartido pelos seus vários filhos**, a cujas partes estes logo puderam e souberam acrescentar outros haveres adquiridos pela mesma forma do seu progenitor e levando-os em parceria também pela forma, isto é, comprados à força e levados à revelia dos direitos reais. Vejamos alguns exemplos:

Foi Senhor de uma parte da villa de SÁ em tempos que os jurados das inquirições de 1258 alegaram não saber mas deixando claro que à época em prestavam as suas declarações ainda alguns homens da villa faziam o foro na dita villa não ao rei, mas aos filhos de Laurencio Roderici da parte que este tivera aí antes que a quarta parte dela fosse doada por um tal Johannes de Saa à igreja de São João de Ervões. Na villa de Santaala (SANTA VALHA) Laurencio Roderici extorquiu de um homem um herdamento foreiro ao rei passando a trazê-lo depois o seu filho (não identificado) por honra; pela mesma época da aquisição do herdamento de Santa Valha, ou algum tempo depois, um tal Rodericus Laurencij que se presume ser aquele mesmo seu filho, possuía a villa de BARREIROS, então na paróquia de São Miguel de Fiães (segundo um jurado de Bobadela, este herdamento de Barreiros havia passado para a posse de Laurencio Roderici por doação de “Domnus Petrus Grasia bragancianus”); ainda pela mesma época, um casal foreiro em Feannes (FIÃES) em poder de Petrus Laurencij, trazendo-o por honra; herdamentos foreiros em Felmir (FELMIR), em poder de Roy Laurencij e Petrus Laurencij, trazendo-os da mesma forma; três casais em Bouadela (Bobadela) herdados de Laurencio Roderici (não são identificados os filhos que os herdaram).

Já no reinado de D. Afonso III, os filhos de Laurencio Roderici possuiam os seguintes haveres: a maior parte do villar regalengo de Tructumir (TORTOMIL), já então da paróquia de Santa Maria de Riparia (act. freg. Bouçoais) em poder de Petrus Laurencij e Roy Laurencij, do prior de São Julião de Montenegro e de outro cavaleiro de nome Petrus Tozeiro, trazendo-as todos as suas partes por honra; outro tanto em “Villar de Sancto Petro” (?) em poder de um de seus filhos, não identificado, em parceria com Petrus Togeiro (o mesmo atrás denominado de Tozeiro), trazendo-a da mesma maneira; a metade da viilla de Outidres (OUCIDRES), outrora toda regalenga, em poder de Roy Laurencij e mais uma vez dividida com Petrus Togeiro; o padroado da igreja de São Pedro de Batocas (act. Freguesia de Águas Frias, Chaves) atribuído a Petrus Laurencij, entre outros; um casal foreiro ao rei em Aquis Figidis (Águas Frias) em poder de Roy Laurencij, trazendo-a por honra; um herdamento foreiro em Castineyra, paróquia de São João da Castanheira (Castanheira, act. conc.Chaves), em poder de Roy Laurencij; a metade de um casal não foreiro na mesma villa de Castanheira, comprado a fidalgos por Rodericus Laurencij; herdamentos foreiros em Barreiros comprados agora por Petrus Laurencij e seus irmãos, não identificados (possível morte ou alienação de Rodericus Laurencij que trazia esta terra por honra); herdamentos foreiros na villa de Zoni (SONIM), ao tempo da paróquia de S. Miguel de Fiães – um deles em poder de Petrus Laurencij, herdado do pai / outros em poder de Roy Larencij e irmãos, não identificados nem determinado o modo como os adquiriram / uma vinha foreira ao rei em poder dos mesmos, comprada por estes e de que não faziam o devido foro ao rei; há uma referência de que os filhos de Laurencio Roderici estavam entre os patronos da igreja de Santa Leocádia de Montenegro e que aí se fizeram herdeiros pela força; a villa de Limaos (LIMÃOS), em posse de Roy Laurencij e seus irmãos; a villa de Limianas (que deve ser a mesma chamada de Limaos), defendida por um tal de Menendus Laurencij, certamente mais um dos tais irmãos de Roy Laurencij; a quarta parte da terra da villa de SÁ (act. freg. Ervões), não foreira ao rei, em poder dos filhos, não identificados, de Laurencio Roderici, que a divididam com a igreja de S. Julião de Montenegro; a villa de VALONGO em poder de Alfonsus Laurencij que poderia ser da mesma progenie; a villa de Monseluarega (MONÇALVARGA) já em posse dos filhos de Rodericus Laurencij e portanto netos de Laurencio Rederici; a villa de Paazoo (Paçô), então na paróquia de Friões, de igual modo em poder dos filhos do mesmo Laurencio Roderici; a metade da terra de villar de ALPANDE, em poder dos filhos do mesmo Laurencio Roderici que dera o rei ao avô deles***.

 

*Nas paróquias de SANTA VALHA, TINHELA, Santa Maria de Riparia (act. freg. BOUÇOAIS) e FIÃES os Laurencij são acusados pelos jurados destas inquirições dos mais infames exemplos de má conduta.

**Cruzando as declarações prestadas pelos vários jurados às inquirições de 1258, principalmente dos do julgado de Rio Livre, será de concluir, com grande margem de probabilidade que todos ou quase todos os Laurencij ali mencionados foram filhos deste Laurencio Roderici, a saber: Petrus Laurencij; Rodericus Laurencij; Roy Laurencij; Martinus Laurencij; Alfonsus Laurencij; Menendus Laurencij.

***Esta breve informação deixada nas inquirições de 1258 pelo jurado de Sadoncelhe, Janeyro Ayras, afigura-se como um precioso indicador de que a presença dos Laurencij nas terras medievais de Rio livre e Montenegro poderá remontar a tempos anteriores ao reinado de D. sancho II.

 

 

Fonte: PMH, INQUISITIONES, Vol. I, Parte II, Fasc. VIII,

in Biblioteca Nacional Digital | Tradução e anotações: Leonel Salvado

 

Observação:

Mais um excelente e soberbo trabalho de pesquisa e investigação do Clube de História de Valpaços sobre o nosso Concelho, particularmente executada pelo Prof. Dr. Leonel Salvado. Muitos parabéns! Fiquei aqui e agora a saber, entre outras, que a minha terra, Stª. Valha, já se chamou em tempos remotos também "Santaala" abreviado: "Santala", por volta do século XIII.

Amílcar Rôlo (2013)

 

Clube de História de Valpaços:

 

Meu caro e inesquecível amigo Amílcar Rolo, que ainda não tive o prazer de o conhecer pessoalmente: Parece que o Dr. Veloso Martins tinha razão quando afirmou que o topónimo não deve ser considerado como mera corruptela de Santa Eulália. Mas o facto de um outro topónimo derivado da mesma padroeira em Vinhais, que hoje se pronuncia Santalha (e que também consta nas inquirições 1258, como tive o cuidado de verificar) não exclui, por esta óbvia parecença fonética, essa possibilidade. Acho por isso que, ao contrário do que afirma Veloso Martins, a hipóteses de corruptela relativamente a Santa Eulália não deve ser descartada, independentemente de entretanto aparecerem no português arcaico outras formas como Santa Olaia e Santa Ovaia. Fosse qual fosse a santa eleita como padroeira de Santaala - Santa Valha (santa Eulália de Mérida - dos inícios do século IV, ou Santa Eulália de Barcelona - dos finais do século III), ambas do Cristianismo Primitivo e ambas com evidente propagação na Península Ibérica), veja a margem de tempo em que se poderá ter havido tal corruptela. A sua terra, caro amigo Amílcar Rolo chamou-se seguramente no século XIII  “ Santaala “ de que Santala é apenas uma abreviação nas actas das inquirições. Congratulo-me com o inabalável interesse do amigo por estas coisas da história da nossa terra.
Um grande abraço.
Leonel Salvado.

 

EliminarLeonel Salvado17 de Setembro de 2013 às 18:17

Prezado amigo de Santala. Falando como professor, a dúvida é sempre a melhor prova do interesse manifestado por qualquer pessoa em relação a qualquer assunto assim como do seu sentido crítico, preocupação essencial para se chegar ao conhecimento da verdade. Sinto-me portanto no dever de contribuir, e com o maior prazer, para deixar-lhe algumas notas de esclarecimento em relação a essa dúvida.
As formas “Santaala” e “Santala” que aparecem (em Latim) no documento, de que traduzi apenas a parte que diz respeito às paróquias do Julgado medieval de Rio Livre – “Incipit Judicatum de Rio Liure”, referem-se, incontestavelmente à primitiva paróquia de Santa Valha, integrada neste julgado (como comprova o documento) e mais tarde no concelho com os mesmos limites (de Monforte de Rio Livre), tendo o nome Santa Valha derivado daqueles.
O actual topónimo de Santalha, no concelho de Vinhais, deriva de uma aldeia com o mesmo nome que também aparece na mesma fonte documental na parte respeitante ao julgado de Vinhais – “Incipit Judicatum de Vinaes” – juntamente com outras paróquias como “Lagarelos” (Lagarelhos), Crespos (antiga S. Fagundo de Crespos), “Villar de Ostis” (Vilar de Ossos), “Candaedo” (Candedo), “Reuordelo” (Rebordelo), “Luzedo”e (Nuzedo de Baixo). Esta actual freguesia de Santalha do concelho de Vinhais aparece no livro da Inquirições gerais de 1258 designada sob formas mais variadas : umas vezes “Santala”, e “Santaala” (como a nossa Santa Valha) outras vezes “Santayala” e “Sancta Aala”.
Não resta, portanto, a mínima dúvida de que Santa Valha e Santalha derivaram de um topónimo comum no século XIII em razão de as respetivas igrejas terem sido edificadas na invocação de Santa Eulália ou outras formas já usadas no português arcaico para designar a mesma santa – Olaia e Ovaia. Esta situação de topónimos comuns não é inédita, pois existem muitos outros ao longo da história envolvendo regiões de relativa proximidade – como é o caso. Posso apontar-lhe outros exemplos, como o de Nozelos (Valpaços/Torre de Moncorvo), Sanfins (Chaves /Valpaços), Vilarinho (2 no concelho de Valpaços e outro no de Chaves) e a semelhança dos topónimos actuais de Valpaços e Valpaço (este em Curopos, Vinhais, o único que aparece nas Inquirições!).
Espero que estas informações sejam úteis e sirvam sobretudo para justificar a razão por que não achei necessário proceder a qualquer anotação a propósito da relação “Santala”-Santa Valha no documento cuja tradução divulgo neste blog.
Um Abraço
Leonel Salvado

 

 

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Anónimo24 de Setembro de 2013 às 12:44

O meu agradecimento professor Leonel!
Simplesmente magnífica a sua informação. Com tanta informação e/ou esclarecimento, espero, contudo, não o ter prejudicado nos seus afazeres, quer pessoais, quer profissionais.
Retribuo cumps.
Amílcar Rôlo

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Dicionário de Toponímia


Santa Ovaia

O topónimo indica a existência de uma capela de Santa Eulália . O antropónimo Eulália aparecia no português arcaico como Olaia , Olalha e Ovaia , segundo as influências regionais. Tem a variante Santa Valha .


Santa Ovaia In Infopédia [Em linha]. Porto: Porto Editora, 2003-2013. [Consult. 2013-10-01].
Disponível na www: <URL:
http://www.infopedia.pt/toponimia/Santa%20Ovaia;jsessionid=3w44dP2LMdbm1aMOeF46rQ__>.

 

 

DOCUMENTOS: Forais de Trás-os-Montes na história do

 

 concelho de Valpaços – MONFORTE DE RIO LIVRE

Por Leonel Salvado

 

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LIVRO DOS FORAIS NOVOS DE TRÁS-OS-MONTES

Cota original: Leitura Nova, Forais Novos de Trás-os-Montes

 

Nota prévia: O Foral novo de Monforte de Rio Livre é um dos 596 forais antigos reformulados entre 1497 e 1520 por D. Manuel I, abrangendo cerca de 570 concelhos por se encontrarem decadentes no século XV. É de interesse relativo para os leitores, visto que não se encontram nele expressamente referidos os lugares que compunham o seu termo mas apenas a necessária alusão ao foral de 1273 recebida de D. Afonso III que lhe fixou os limites que assim se mantiveram no novo diploma. Porém, não deixa de ser um documento de grande importância histórica para um determinado número de freguesias que constituem o actual concelho de Valpaços e que se sabe pelos mesmos forais, dentre outros documentos, terem pertencido, durante mais de cinco séculos, ao termo de Monforte, como são os casos de Alvarelhos, Barreiros, Fiães, Tinhela, Fornos do Pinhal, Lebução, Nozelos, bem como das abadias de Bouçoães, Santa Valha e Sonim. Os critérios usados para a transcrição e apresentação de leitura actualizada do presente documento são os que estão enunciados a seguir aos dois primeiros textos expostos. No final desta publicação apresento uma transcrição do original, em latim medieval, da referida Carta de Foral de Monforte de Rio Livre de 1273.

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                              Memórias Paroquiais de 1758 e outros registos do “lugar” e Freguesia de Santa Valha:

No manuscrito de 1758 do padre Domingos Gonçalves, Pároco/Abade de Santa Valha, (Aldeias do Concelho de Valpaços nos meados do século XVIII por freguesias – Santa Valha), consta, entre outras memórias, o seguinte:

O “lugar” de Santa Valha, mais propriamente a sua “Abadia”, pertenceu, entre outras e durante mais de cinco séculos ao termo (Vila) de Monforte de Rio Livre, pelo Foral “Novo” reformulado por D. Manuel I, atribuído na vila de Santarém em 01 de Junho de 1510, conforme consta no próprio documento – Forais - arquivado na (DGRQ) Direcção – Geral de Arquivos na Torre do Tombo em Lisboa.

Os 598 forais antigos reformulados de todo o país foram todos atribuídos por D. Manuel I, entre 1497 e 1520.

Havia anteriormente um foral de (04 de Setembro) 1273 recebido de D. Afonso III, que compunham o seu termo e limites que se mantiveram no novo.

 

Este tal lugar fica na Província de Trás-os-Montes, Bispado de Miranda, Comarca de Torre de Moncorvo, Termo da Vila de Monforte, Freguesia de Santa Eulália. É d’el Rei, Nosso Senhor, ao presente e sempre o foi.

Tem tal lugar, cento e quinze vizinhos e trezentas e noventa pessoas.”

 

Não tem termo seu, pois está sujeito ao termo da Vila de Monforte e dista desta duas léguas (Nota: nessa data a Sede da Vila já era em Lebução e não no próprio Castelo de Monforte).

Não tem juiz ordinário nem câmara e, por esta razão, está sujeita ao juiz ordinário e câmara da Vila de Monforte.

 

Dista, o dito lugar, de Miranda do Douro, cidade capital, dezasseis léguas, e de Lisboa oitenta léguas.

 

Não padeceu ruína alguma no terramoto [de 1755].

 

O pároco é abade, apresenta-o o Padroado e tem de renda, com a patriarcal, um conto [1 000 000 de réis].

 

O “Orago” é Santa Eulália que está no Altar-mor. Tem quatro Altares, o mor e dois colaterais, um da parte da entrada, de Nossa Senhora do Rosário, e outro da parte do Meio-dia, à direita, do mártir São Sebastião e uma capela ao lado esquerdo, do Santo Cristo com uma escada para o corpo da igreja, administrada por Jerónimo de Morais Castro, Morgado da Teixugueira. Há mais duas capelas dentro do povo, uma defronte da matriz, de São Miguel, e outra de Santa Maria Madalena, no bairro da Madalena, administradas as duas com as esmolas da vizinhança. Tem mais outra, de Santo António, no bairro assim chamado, que administra esta o Morgado António José de Morais Castro. E tem duas Irmandades, uma das Almas e outra de Nossa Senhora do Rosário.

O pároco é abade, apresenta-o o Padroado e tem de renda, com a patriarcal, um conto [1 000 000 de réis].

As ermidas ou capelas são três, dentro do lugar, de que já falei. A elas não acode nunca gente em romagem senão, por acaso, alguma vez.

 

Não há nesta terra outras coisas notáveis de que se possa dar conta. É muito pouco o tempo para se fazer como deve.

 

          

         Origem do nome de Santa Valha:

 

 

1)      Ouvimos dizer, que os “Manuscritos” existentes de todas as aldeias de Portugal de há 250 anos atrás, acima referidos, foram mandados fazer aos Padres das Paróquias/Abadias, por ordem do governo do Primeiro-ministro de então, Marquês de Pombal, em virtude dos que existiam, terem sido destruídos pelo terramoto de 1777 em Lisboa. Estes manuscritos encontra-se actualmente nos arquivos da Torre do Tombo em Lisboa (DGRQ – Direcção - Geral de Arquivos – Memórias Paroquiais).

 

2)      O lugar denominado de Santa Olaia ou Eulália e o monte contíguo do Crasto são os locais onde tudo indica ter nascido o primeiro povoado de Santa Valha. A conhecida “fraga parideira” no monte de Santa Olaia, onde nos tempos primitivos as mulheres pariam os seus filhos é uma dessas referências, assim como as outras a nascente do monte do Crasto.

 

3)      Os Documentos ou Manuscritos das Inquirições de 1258 referem que Santa Valha se chamava nesse tempo  ” Santaala “, abreviado Santala. Consta nesses mesmos manuscritos várias vezes a seguinte referência: Igreja e Paróquia de Santaala (Santa Valha) de Terras de Rio Livre. 

                                                                         

4)      Santa Valha poderá, em tempos remotos, também ter sido chamada de Santa Ovaia. Já quanto ao nome da freguesia, nos documentos/manuscritos de que tivemos conhecimento recentemente (Janº. 2012), consta, que em 1655, se chamava: lugar de Santa Valha da "Freguesia de Santa Olaia" e, em 1758, se chamava: lugar de Santa Valha da "Freguesia de Santa Eulália"; Santa Eulália que é Padroeira/Orago da nossa freguesia.

 

5)      A forma como se escreveu e se chamou ao longo dos séculos o nome da nossa aldeia sofreu uma evolução bastante grande, conforme nos dizem os documentos e manuscritos antigos a que tive acesso: inicialmente ou quiçá no início da nacionalidade (1143) - chamou-se Santaala, abreviado Santala  ( … , …,? ) e, por, último Santa Valha.

 

Nota: Quem estiver interessado em ler parte destes manuscritos/documentos, poderá fazê-lo no espaço do nosso Site: Link- Freguesia.

 

*** A freguesia de Santa Valha pertenceu ao concelho de “ Monforte de Rio Livre ” até à extinção deste a 31 de Dezembro de 1853. Santa Valha foi abadia do Padroado-real.

Existem ainda algumas pessoas mais idosas da nossa aldeia, que dizem, ter ouvido falar aos mais antigos, que por volta de 1836 houve uma divisão bastante grande de opinião nos meios políticos e de outras pessoas do poder quanto à reivindicação da transferência da Sede do Concelho de Monforte de Rio Livre (localizada no próprio Castelo de Monforte já sem condições  de instalação) para Lebução, pelo motivo seguinte: uns deles defendiam essa transferência para Lebução (como se veio a verificar) e outros, para Santa Valha, atendendo à enorme importância da Abadia do Padroado-real de então de Santa Valha e da própria freguesia em si. Porventura - no meu entender - também o poder dos dois morgadios familiares de Santa Valha, como o “Morgadio de Santo António dos Aciprestes” e Descendência e o da “Quinta da Teixogueira”, gente importante da monarquia e de regime único da época, teria certamente contribuído de alguma forma também para essa divisão de opinião diferente e reivindicativa.

 

 

Aproveitamos para deixar aqui mais algumas notas historiográficas referentes à evolução do concelho de Valpaços:

Foi por Decreto de 6 de Novembro de 1836 emanado do ministério setembrista de Manuel da Silva Passos (Passos Manuel), que a então pequena localidade de Valpaços se viu elevada a sede de concelho da freguesia com o mesmo nome, com a designação de freguesia de Santa Maria de Valpaços, integrando, apenas, as localidades anexas de Lagoas, Valverde e Vale de Casas. Por ser o concelho tão modesto, dificilmente se poderia, àquela data, antever-se os sucessos que o destino lhe reservava ainda.

 

……..Após um novo código administrativo promulgado pelo mesmo Ministro em 31 de Dezembro desse mesmo ano de 1836, código esse que se inspirava nas reformas que já haviam sido preconizadas por Mouzinho da Silveira e apontadas no mesmo sentido democrático e descentralizador da administração pública, abriram-se claras perspectivas para um futuro engrandecimento da história do municipalismo valpacense. Com efeito, logo em 27 de Setembro de 1837, por carta de lei, eram integradas no concelho de Valpaços as freguesias de Alhariz, Ervões, Friões, Lilela, Possacos, Rio Torto Sanfins, Vassal e Vilarandelo, que pertenciam ao termo de Chaves. Dezasseis anos depois, o Decreto de 31 de Dezembro de 1853 extinguia os concelhos e comarcas de Carrazedo de Montenegro e Monforte de Rio Livre, e determinava a transferência das freguesias dos respectivos termos, no todo e em parte, respectivamente, para o concelho de Valpaços. De Monforte passaram para Valpaços as freguesias de Alvarelhos, Barreiros, Bouçoais, Fiães (inicialmente integrada no concelho de Chaves e passada ao de Valpaços a 24 de Outubro de 1855), Fornos do Pinhal, Nozelos, Santa Valha, Sonim, Tinhela e Lebução, sendo de notar que era a localidade de Lebução que, desde 1836 assumia a categoria de sede do concelho de Monforte do Rio Livre, ainda que prevalecesse esta designação. Do concelho de Carrazedo de Montenegro passaram ao de Valpaços, além da própria sede, agora extinta, as freguesias de Água Revés, Argeriz, Canaveses, Padrela e Tazém, Sanfins, Santa Maria de Émeres, São João de Corveira, São Pedro de Veiga do Lila, Serapicos, Jou, Curros e Vales. Em 1896 Jou, Curros e Vales foram anexadas a Murça, em resultado de uma jogada política do candidato regenerador à eleição pelo círculo de Alijó, Teixeira de Sousa, mas dois anos depois, sob o governo do Partido Progressista de Luciano de Castro, as duas últimas freguesias são reintegradas no concelho de Valpaços.

Com tão vasto termo municipal, Valpaços foi elevado à categoria de Vila, com o nome de Valpassos, por Decreto Real de D. Pedro V, datado de 27 de Março de 1861. Finalmente, no dia 13 de Maio de 1999 foi a Vila elevada à categoria de Cidade.

(Autor: Câmara Municipal de Valpaços – 06-11-2010.)

 

 

         Freguesias a distribuir pelo Concelho de Valpaços em Meados do Século XVIII

 

                  Censos das Freguesias que integram agora o Concelho de Valpaços da Primeira Metade do Século XVIII.

                                      

  Fontes: “COROGRAFIA e desrcipçam topográfica do famoso reyno de Portugal…” do Padre António Carvalho da costa. (1706 – 1712), TRATADO III – Da Comarca & Ouvidoria de Bragança,TOMO ICAP. V [pp. 506 – 511 | id, LIVRO SEGUNDO – Da Comarca da Provincia de Trás os Montes, TOMO PRIMEIRO, CAP. III – Da Villa de Monforte do Rio Livre, pp. 433 - 434 | Leonel Salvado, O Concelho de Valpaços nas “Memórias Paroquiais de 1758” in blogue Clube de História de Valpaços.

 

                                

     Nota: Mapa da “Antiga Lusitânia” extraído do livro “Valpaços Rostos do Tempo” da autoria do Prof. José António Soares Silva.

 

                                      

     “ Santa Valha em 11 de Maio de 1939 vista desta forma pelo Padre João Vaz de Amorim, mais conhecido por João da Ribeira.”

    

 


 

 

Autor: Monografia de Valpaços de A. Veloso Martins – Ano de 1978

Fim.

Santa Valha, 01 de Março de 2015