MEMÓRIAS E DATAS QUE MARCARAM VÁRIOS ACONTECIMENTOS NA NOSSA TERRA

 

Coisas e Gentes da Nossa Terra

Tradições, Usos e Costumes:

 

A última Partilha do Burro, Casamentos, e Enterro do Entrudo na nossa aldeia, foi feita no ano de 1977. Esta tradição acontecia todos os anos na altura do Entrudo. Também o Carnaval, conhecido por cá na altura por Entrudo, era tradição obrigatória até final da década de 1970 e mesmo início de 1980. Lembramo-nos dos especialistas e ferrenhos na arte, que nunca deixaram morrer a tradição, nem que chovesse “a cântaros”, como era o “líder” Toninho Rolo, filhos, e o sogro Manuel Coroado, conhecido pelo “Ti Carvela e Terra Quente”, que residia em Edral do Concelho de Vinhais, o Joaquim “Padeiro”, o José “Sarrá” etc. Também outros já mais jovens como o Joaquim Leite Contins, Zé Manuel Nogueira, Elias Ervões e irmãos, Lilo, e outros mais.

Ouvi dizer que os “Ti Carvela e Sarrá”, eram tão ferrenhos nesta arte, que um certo dia, mataram uma burra(o) velha(o) para os lados de Monte Cerdeira,  tiraram-lhe a pele, para fazer um bombo para os instrumentos do Entrudo que se aproximava, dizendo ao dono que a(o) encontraram morta(o).

A partilha ou divisão do burro (testamento) e os casamentos do entrudo era uma tradição que se realizava na última quinta-feira antes do carnaval. Era engraçado de se ouvir, pois estava tudo sempre na expectativa, em particular as moças casadoiras e até algumas senhoras solteiras, que não gostavam nada do que ouviam, nomeadamente dos casamentos, quando o par não era a seu gosto, e também se lhes tivesse calhado um verso com uma das partes do animal que não fosse do seu agrado.

No dia seguinte a partilha do burro e os casamentos eram tema de conversa em toda a aldeia; se porventura alguma viesse a reclamar, no ano seguinte seria bem pior. Havia versos brejeiros e casamentos para todos os gostos.

Os rapazes já adultos escreviam quadras testamenteiras destinadas às raparigas e solteironas que depois gritam bem alto para toda a povoação ouvir, revelando os defeitos e virtudes de cada uma, ou um. Nessa noite, os rapazes divididos pelos lugares mais altos de cada bairro da aldeia disparavam contra o ar, como se tivessem morto um burro; ouvia-se o zurrar e ao segundo tiro de caçadeira era dada a notícia que o burro morreu - os rapazes chamam-se entre si de “compadres”. Seguia-se a "partilha/divisão do burro e casamentos”, feita através da récita das quadras. Para o efeito, usavam-se vários funis do vinho, conhecidos por embudes a servir de altifalantes.

Alguns bons especialistas nos anos 1950 e 1960: Irmãos Toninho, Manuel e João Rôlo; Zé Gonçalves (Gago); Alípio Cardoso; Zé Cavalheiro; irmãos: Manuel, Zé, e Óscar Barrosão, entre outros.

A última Partilha do Burro e Casamentos foi feita pelos seguintes conterrâneos: António Neves (Tótó); Lilo Rôlo; Carlos Cardoso; Carlos e Jorge Fontoura; Agenor Rôlo e irmão Zé; Ricardo Moreiras, Alexandre Mairos, Helder e João Barrosão, Hélder Vieira, entre outros. Já quanto ao Enterro do Entrudo desse mesmo ano, a organização foi dos mesmos elementos, mas com a participação de toda a juventude e até de muitos adultos (perto de 200), contribuíram para o sucesso ainda hoje recordado. Não posso deixar esquecido o saudoso (falecido) José Joaquim Lopes “Zé Lopes” do bairro dos Ciprestes , que fazia de padre por debaixo do palio, seguindo à frente da urna improvisada, juntamente com algumas carpideiras e “familiares enlutados “ do falecido Entrudo.

Também outras tradições populares herdadas se foram perdendo progressivamente no tempo, como os jogos aos domingos e dias Santos: Chino, Fito e Pedra, que se realizavam quase sempre perto das tavernas. Havia um local mais distante que era junto à amoreira, agora rua  de Stª. Maria Madalena. As tradições da Serrada da Velha, do Rapa na noite de natal, do Cantar dos Reis, Levar o Ramo ao Padrinho, das Maias na visita Pascal e do Toque das Trindades, umas, a partir do final da década de 1970, e outras, do final da década de 1980, seguiram o mesmo caminho.

O jogo do rapa na noite de natal (rapa/tira, deixa, põe) era jogado com pinhões, extraídos das pinhas dos pinheiros mansos, onde os miúdos e os adultos, mesmo até os avós, se divertiam com esse jogo, enganando-se mutuamente, para ajudar a passar parte da noite de natal. Alguns (muito poucos) mais endinheirados, jogavam também com rebuçados, mais propriamente conhecidos por “catraios”, mas era caso raro.

No cantar dos reis, se porventura, as casas a quem se ia cantar, não abrissem a porta ou não oferecessem nada, era costume “ameaçar” em voz alta, com a cantiga/verso das “Barbas de Farelos”, assim cantada/recitada:

Estes reis que nós cantámos; Voltemo-los a descantar; Estes Barbas de Farelos; Não têm nada para nos dar.  

Um verso:  Estes reis que nós cantámos; Não são pagos com dinheiro; São pagos com vinho fino e chouriças do fumeiro.

A “Serra(da) da Velha”, era uma brincadeira, tanto de jovens, como de adultos, que se realizava no meio da Quaresma, a uma quarta-feira.

Rapazes e raparigas andavam em grupo pela rua ao anoitecer com umas latas velhas a raspar nas paredes das casas das mulheres mais idosas, mas estas tinham que ser obrigatoriamente “avós”, dizendo em voz alta o seguinte: Raspa/Serra na velha, Raspa/Serra na velha, Raspa/Serra na velha …….. :

- Vamos serrar a velha?. ; Vamoooos!.; Para o que é que há-de servir o corpo dela!.; (diziam em voz alta várias coisas que lhe viessem de momento à cabeça). Enquanto serravam a mulher, fingindo serrar o caldeiro velho, os rapazes proclamavam em altas vozes para os presentes, uma quadra brejeira, alusiva à data e à pessoa (velha).

 Estas, aborrecidas com o barulho nas paredes das suas casas e com tais dizeres e  já sabendo da tradição desse dia, tinham sempre à mão um púcaro ou tacho de água, ou uma “penicada” , para atiram em cima dessa “criançada”. O que valia é que as paredes das casas eram de pedra e não estavam pintadas com cal.

Pela noite dentro, os mais velhos, percorriam todos os bairros da aldeia com um odre do vinho em cima de um burro e uma zorra a reboque, recitando versos tradicionais e pedindo em cada casa uma pinga de vinho para beber, e outra, para a velhinha, destinada  a encher o obre. Se eventualmente o pedido não fosse atendido, raspavam com latas velhas nas paredes das casas das “velhas” e serravam na zorra de madeira, dizendo: raspa e serra na velha, raspa e serra na velha, raspa e serra na velha…. .

O Ramo ao Padrinho: Era no dia de Ramos, antes da Páscoa, quase sempre depois da missa. Os  “miúdos e até alguns graúdos” enfeitavam um ramo de oliveira com bolachas e rebuçados pendurados por fios, e iam a caso do padrinho ou madrinha oferecê-lo, e desejar-lhe boa semana de Páscoa, sempre com o pensamento numa contra-partida, que normalmente era em dinheiro (moedas). Os com mais posses, enfeitavam melhor o ramo, com mais alguns doces, e até alguns, com um salpicão e/ou linguiça penduro. Esta tradição já quase não existe no presente ano de 2010. Contudo, contaram-me algumas pessoas que presenciaram este ano um sobrinho, levar o ramo ao padrinho, da forma que atrás referimos. Foi o afilhado José Martins Rôlo, de 53 anos de idade, levar o ramo enfeitado ao padrinho Artur “Feijão” de 83, em que este, agradeceu e retribuiu, com a oferta de um garrafão de cinco litros de azeite ao afilhado. “ Lá viu ele que o afilhado não colhia azeite e era só isto que ele necessitava”.

A tradição das “ Maias”, consistia no seguinte: Havia sempre um enorme grupo de miúdos e até alguns bastante já graúdos, que acompanhavam o Sr. Padre em cortejo na visita pascal a todas as casas da aldeia. No fim da visita, era normal os donos das casas oferecerem aos acompanhantes (miúdos) alguma coisa para comer, conhecida por “maias” que normalmente eram, quase sempre,  figos secos, castanhas, maçãs e até algumas nozes, atiradas, salvo raras excepções, da varanda ou da janela para o chão do pátio ou da rua (estupidez da época). Quando a casa era mais abastada, a miudagem estava sempre à espera que a oferta fosse um pouco melhor, como, por exemplo: rebuçados “catraios” ou bolachas.

As “Maias”, eram sempre pedidas pelos miúdos em voz alta quando o Sr. Padre e os restantes elementos do grupo que o coadjuvavam com a Cruz de Cristo, Caldeia da Água- Benta, Sineta, e ofertas/donativos), acabassem a visita, que era o seguinte: Boa casa; Boa brasa; Bom ferrolho; Bom trambolho; Venham as “Maias”. Se porventura não oferecessem nada, diziam também em voz alta: Má casa; Má brasa; Que lhe dê uma dor de barriga (caganeira) e que lhe caia a casa em cima.

Quanto à oferta das “Maias”, concordamos com esse feito, pois era sinónimo de alguma alegria e certa pobreza à mistura. Já quanto à forma de oferecer, ou seja: atirar para o chão, assim como se fazia também nas amêndoas dos casamentos à saída da igreja na praça, era uma verdadeira estupidez, falta de respeito, de cultura e higiene.

Também a Visita Pascal, (por volta do fim da década de 1980 ou início de 1990), deixou de ser feita pelo Senhor Padre (Compasso), tendo esta festa católica sido delegada a leigos, e a tradição da abertura da porta à Cruz de Cristo crucificado está-se a perder progressivamente, deixando, de certa forma, uma enorme nostalgia desse passado católico.

O Toque das Trindades, “após o pôr-do-sol e antes de anoitecer”, hora de recolha a casa, em particular os mais novatos e, onde os mais velhos , davam ordens desse dever, que todos acatavam. Os sinos da igreja tocavam todos os dias três vezes (com intervalos) para um convite a rezar a Avé-Maria. Infelizmente também esta tradição deixou de existir a partir do fim da década de 1970.

Pedir a “Bênção aos Padrinhos” e, o “Cumprimentar dos Compadres/Comadres”: Os jovens, ao passarem pelos padrinhos, avós, e até tios, para os cumprimentar, diziam o seguinte: Padrinho,  dê-me a sua bênção! Beijando-lhe ao mesmo tempo a mão direita. Estes retribuíam com a seguinte frase: Deus te abençoe meu afilhado/neto/sobrinho. Também os pais dos afilados, ao passarem (cruzarem) pelos compadres ou comadres, para se cumprimentarem, diziam da seguinte forma: Bom dia compadre/comadre, Nosso Senhor o/a salve! Estes(as), retribuíam  da seguinte maneira: Boa dia compadre/comadre, Salve-o(a) Deus Nosso Senhor!  Restam muito poucas pessoas idosas na nossa freguesia que ainda usam esta cultura religiosa de cumprimentar.

Houve também uma tradição muito antiga, que se realizava depois do natal ou ano novo e que já muito poucos se recordam, chamava-se “ A Chocalhada ou Cavalhada”. Os jovens e até alguns adultos, vestiam-se com alguns arreios dos animais de trabalho e andavam com eles pelas ruas numa correria e algazarra ensurdecedora, imitando-os e cantando cantigas/versos tradicionais, alguns até bastante brejeiros em frente de certas casas, já antecipadamente referenciadas. Essa tradição perdeu-se no tempo a partir das primeiras décadas do século XX (1900).

Ainda outra muito engraçada e de que toda a gente gostava, “As Serenatas”. Pela noite dentro, alguns tocadores e bons recitadores de versos deixavam apaixonadas mensagens amorosas em frente às casas de moças casadoiras. Disseram-me recordarem-se de alguns bons especialistas em Serenatas, tais como: os falecidos António Teixeira e Abílio “da Maria dos Santos”, e ainda, o Aníbal Barreira, “cinquenta” como era conhecido, também bom cantador de reis. Certamente haveria outros, mas foram só estes de que me falaram.

Parte destas tradições, deixadas perder no tempo e que atravessaram gerações, seria muito importante vir a recuperá-las, pois simbolizaram alguns usos e costumes da nossa terra, valioso património cultural da época. A preservação dos valores herdados é necessária e importante.

A história e a cultura de um povo, são tão ricas, quanto maior for o seu passado, e, Santa Valha, tem este, e muito mais passado que nos orgulha e nos enriquece. 

 

Dia das Comadres e dos Compadres.

A celebração do “dia das comadres e dos compadres” que se realizava anualmente nas duas quintas-feiras que antecediam o entrudo foi também uma tradição que se perdeu na nossa comunidade por volta de finais da década de 50 ou início 60.

Contou-me a minha mãe, que já conta a bonita soma de 84 anos, que nessa bonita celebração, era costume as comadres convidarem-se umas-às-outras para almoçar, lanchar ou jantar e confraternizar um pouco, seguindo-se na quinta-feira seguinte do mesmo modo os compadres. Eram convívios separados, onde as comadres e compadres com mais posses no final ofereciam fumeiro ou outra coisa de valor às comadres ou compadres mais necessitados.

 

O fogo ou fogueira de Natal é um dos usos e costumes que ainda se mantém bem vivo até hoje (2013). Só que a lenha acarrada para o largo da praça já não é em carros de bois e às costas, mas sim por tractores da aldeia. Muitíssimo mais lenha a arder e mais respeito que antigamente. Muitas memórias de histórias de fogos nos foram contadas, algumas com peripécias menos agradáveis. Os maiores fogos de natal na praça foram, sem dúvida alguma, os de 2011 e 2012, mas o do último ano de 2012 superou todos. Em 2013 não foi possível cumprir esta tradição e costumes em virtude de uma enorme intempérie de imensa chuva e vento forte como companhia que se fez sentir durante todo o dia e noite de consoada, prolongando-se mesmo durante todo o dia de natal, facto jamais visto nestas últimas décadas.

 

Tradição da Bênção do Gado:

A crença da tradição da bênção do Gado já vem dos tempos remotos do século XV. Na nossa aldeia era costume essa tradição de muita religiosidade ser feita na manhã do dia da festa de São Caetano pelo pároco da freguesia. Havia também lavradores ou criados que davam um certo número de voltas com os seus animais em volta da capela  pedido ao Santo que os protegesse de algum eventual perigo, ou certamente cumprindo alguma promessa já anteriormente feita nesse sentido. Após, era normal os donos oferecerem ao São Caetano um donativo em espécie ou dinheiro. Essa tradição foi-se perdendo a partir de finais da década de 70 ou início de 80.

 

Matança do Porco:

Até finais da década de 1980, era rara a casa da nossa terra, em que não tivesse a matança do porco, tradição que se praticava durante todo o mês de Dezembro e até ao dia 6 de Janeiro, dia de Reis.

Havia espalhados por toda a aldeia, vários especialistas na arte de “ matar e desfazer o porco. Recordamos alguns nomes: José Joaquim Rôlo; Rocha: Fernando “Pedreiro”; Francisco “Ferruge(s); Victor Cardoso; Maurício; João “Nascimenta”; Manuel “Cantarinhas”, mais tarde: Amadeu Moreiras; Agostinho Pires “Nascimenta”; José Domingues; Manuel Fontoura; Filipe Nascimento e Domingos Mosca Pires, Fernando Barreira, entre outros.

Esta tradição artesanal secular foi-se progressivamente perdendo, devido à facilidade de aquisição e oferta dos produtos com carnes e enchidos (fumeiro) de porco, do sistema industrial. Também o aparecimento dos frigoríficos  e, mais tarde, das arcas congeladoras, vieram substituir as salgadeiras de conservação das carnes de porco, que tinham que durar para todo o ano.

A brincadeira ou “malandrice” da “Pedra de Lavar o Porco”, que os mais velhos faziam às crianças na matança, quando da lavagem do porco, também se perdeu com o tempo.

Por tudo isto contado, hoje só restam pouco mais que dois matadores artesanais na aldeia, o Fernando Rôlo e o Manuel “ da Lina”, arte, que só aprenderam há poucos anos.

Nas décadas de 1950, 1960 e início de 1970, houve sempre talho na nossa aldeia. O “açougueiro ou magarefe”, como se dizia nessa época, era o (falecido) Amadeu Moreiras “Pedreiro”. O último talho dele funcionou num pequeno armazém na praça, já demolido, onde hoje se encontra o coreto.  O preço da carne de cordeiro, a mais vendida, já que a de vitela era só em dias festivos, rondava na década de 1960, os seis escudos (0,3€). Mais tarde, o Sr. Fernando Barreira, após ter regressado de Angola, foi matando alguns animais para venda, num baixo da sua antiga habitação.

 

A Pedra de lavar o porco:

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Recordo-me da matança do porco dos meus tempos de criança. Era uma festa e o símbolo de uma casa farta durante o ano. Antigamente as famílias matavam o porco para comerem a carne durante todo o ano. Era nos meses de mais frio, normalmente Dezembro e Janeiro, que se matava o dito-cujo.

A carne, a maior parte dela, era utilizada em vários manjares. As melhores, logo a seguir à matança, como, por exemplo, as costelas assadas e o lombo, ambos de “vinho e alhos”. As restantes, utilizadas no fumeiro, e a salgada, era durante todo o ano que se  comia, principalmente nos dias de lides mais duras do campo.

Quem não se recorda do mata-bicho de uma (d)escavada ou apanha da azeitona, etc., onde um alheira na brasa ou uma linguiça assada, ali mesmo no local, sabia pela vida.

Nesse tempo havia vários matadores ou sangradores em Santa Valha. As famílias convidavam os familiares e outros amigos, que também serviam de agarradores, para trazer o porco até ao banco de sangria.

Depois do porco estar morto, passava-se à limpeza dos pelos do couro com palhas acesas. Nesse acontecimento, seguia-se quase sempre, uma espécie de ritual; As crianças das famílias e não só que assistiam ao acontecimento festivo, eram mandadas a casa de uma qualquer pessoa, para lhe pedir uma pedra boa – especial -, para lavar o porco. As crianças (inocentes), não tinham conhecimento dessa brincadeira dos adultos e lá iam, pensando estarem a fazer uma tarefa importante e útil.

Chegados à casa indicada pelos mais velhos, pediam então a dita pedra emprestada, normalmente ao patrão da casa; Este, que já tinha conhecimento da tradição, dizia-lhe por vezes, que a não tinha com ele e que estava na casa de outro fulano de outro bairro. Então, chegados à casa desse tal fulano, as mesmas palavras repetiam-se, e andavam as crianças, quase toda a manhã, a correr o povo, à procura da pedra, pois todas as pessoas da aldeia conheciam a tradição da pedra de lavar o porco. Mas havia também alguns que os mandavam esperar um bocado para lhe colocar em cima das costas um enorme pedregulho, escondido ou não dentro de um saco.

Finalmente, ao chegar a casa (local da matança), após bastantes minutos ou até mesmo horas passados, a maior parte das vezes já depois do comer do sarrabulho, com ou sem a pedra, logo se apercebiam que foram enganadas, pois as gargalhadas indicavam a brincadeira, que lhe serviria de lição para o futuro e ao mesmo tempo do passar de testemunho quando fosse adulto.

Lembro-me de ouvir dizer, que ao meu amigo Pereira, deram-lhe uma vez uma pedra de vários quilos para lavar o porco que mal podia com ela. Também, que essas pedras de vários quilos de peso, eram a maior parte das vezes colocadas dentro de um saco de sisal, muito bem apertado para a crianças não se aperceberem que tipo de pedra transportava às costas, assim como o pedido feito pelo dono, para ter o máximo de cuidado no transporte, para não a vir a estragar.

Autor: Carlos Vieira - (Março de 2009) - Publicado no Jornal “Tribuna Valpacense” em 2012.


 

O  “Porquinho de Santo António”:

Era habitual, até meados da década de 1970, algumas pessoas da nossa freguesia e de muitas outras de toda a região e país, quando tivessem fêmeas (porcas) em “casa” a parir, fazerem uma promessa a Santo António, da oferta de um porquinho, se no parto do animal, tudo corresse conforme desejado.
A esse animal “porquinho”, ainda na fase de “leitão”, era colocado um chocalho no pescoço, para toda a gente da aldeia saber onde se encontrava, já que vagueava dia e noite pelas ruas de todos os bairros, “roncando e chocalhando, é claro” e toda a gente lhe dava de comer ao passar à sua porta.
Quando já estivesse na fase adulta, (aí com cinquenta quilos), o animal, também conhecido no meio rural por “reco”, era retirado da rua e da liberdade , e ia a leilão, à saída de missa, para quem o pretendesse comprar, no sentido de o acabar de engordar (cevar) e servir na anual e tradicional matança familiar. O produto do leilão era então oferecido à igreja como esmola para o Stº. António.
Este uso e costume por  promessa deixou de se fazer (por volta de 1974/75), quando começou a aparecer em todo o País, um vírus, denominado por peste suína africana, vitimando muitos animais e que se prolongou por alguns anos até ser erradicada. Também com o fim da ditadura e com a entrada da democracia, a qualidade de vida das pessoas melhorou substancialmente, sobretudo na forma como as pessoas passaram a viver.

Nota: Também era habitual as pessoas oferecerem fumeiro, com o mesmo fim, leiloado ao longo do ano, à saída de missa.

Autor: Amílcar Rôlo  -  (Janº. de 2009)

 

A “Tradição de Pagar o Vinho”:

Até meados dos anos 70 do século passado (XX), era tradição na nossa aldeia, assim como também em outras do concelho, os rapazes solteiros residentes em outras localidades que viessem a namorar raparigas da terra, terem obrigatoriamente que pagar aos homens solteiros e casados locais, normalmente frequentadores das tavernas, um cântaro de vinho, ou até mesmo um almude, conforme a multa ou penalização verbal popular, bem ainda, como também em alguns lugares, uma quantidade de pães (de cantos) de trigo,  equivalente à altura do rapaz namoradeiro.

Porém, essa mesma tradição por vezes não era bem compreendida por alguns menos cultos e mais zaragateiros da nossa aldeia, que chegaram, em algumas situações de desavenças por não pagarem o vinho (e o trigo), a mergulhar os faltosos com a tradição, na poça do Outeiro, que ficava junto à fonte do mesmo nome, como quem vai para o bairro da Freixa. Por esse motivo a rapaziada dessa época chamava a essa poça com o chão de terra/lodo, a poça dos cães. Contaram-nos que chegaram a bater em alguns faltosos e até mesmo a haver zaragatas  internas, por divisões de opinião. Também havia a quem chamasse a essa tradição, a tradição do “Vinho Namora”.

 

Fogo ou Fogueira do Natal.

 

O acender do fogo ou fogueira de natal, também conhecido noutras regiões por madeiro, é uma das poucas tradições seculares da nossa aldeia que ainda hoje sem mantém bem viva.

Antigamente, a lenha para o fogo na  praça, local onde sempre se acendeu e continua a acender, era transportada em carros de bois, com ajuda dos animais e com a força dos homens que, por vezes, os substituíam, puxando, eles próprios, o carro de bois. Quando a lenha não era suficiente para a noite inteira, havia mesmo alguém que ia roubar às tantas da noite às casas dos lavradores com mais posses.

A partir de finais da década de 70 do século passado, já com um ou outro tractor na aldeia, começou este progressivamente a substituir esse velho transporte. Recordamo-me de alguns entusiastas de outros tempos, entre outros: Manuel Catalão, vulgarmente conhecido por Manuel Capela e os irmãos Celestino e Artur Domingues, também conhecidos por “Néné” e “Praça ou Zé Velho”, duas principais figuras típicas da nossa aldeia que nunca largavam o fogo, estando sempre por perto dos cântaros e regadores de vinho que um ou outro lavrador ou taberneiro  mais abastado e  benemérito fazia chegar ao fogo durante a noite.  É claro, com tanta bebida à descrição de alguns mais “esfomeados” desse precioso néctar, a coisa azedava quase sempre a partir de certa hora da noite, com justificação para esse motivo, que não podia “chiscar/mexer” no fogo porque não tinha ajudado no carregamento e transporte da lenha dessa tarde.

Raro era aquele costumeiro que lá pernoitava até mais tarde, que não levasse consigo para perto do fogo e escondido num canto qualquer, um estadulho, sacho, ou outro objecto, para o que pudesse vir a acontecer. Por vezes, servia mesmo um pau qualquer que estivesse a arder no lume. Ainda bem que estas brincadeiras de mau gosto já se não passam hoje em dia. Recordamo-nos também e perfeitamente de alguns Santavalhenses que chegaram, até a algumas décadas atrás, a dormir junto ao fogo, deitados em cima de um molho de palha em frente à porta principal da capela de São Miguel (São Caetano), certamente já com a cabeça bem pesada da qualidade de bebida ingerida durante a tarde e noite inteira de consoada.

Continua a chamar-se ainda a isto, “guardar o fogo” até ao amanhecer e/ou romper o dia.

 

 

 

Tinha-mos muito pouco, mas tínhamos quase tudo……,

 

Santa Valha foi, é, e será sempre uma aldeia bonita.

Na minha juventude, tínhamos quase tudo, menos, entre algumas, a electricidade. Vivia-se quase às escuras, onde a candeia e o lampião a petróleo ou azeite, substituíam a moderna fonte de energia, só existente em vilas e cidades.

Naquele tempo, tínhamos os nossos próprios  artistas e instrumentos musicais, o " Realejo, havia muitos: Adamastor e Artur “Praça ou Zé Velho” a Concertina, havia algumas: Ló, Zé Barrosão, Ernesto e Duarte Mairos, e ainda o  Acordeão tradicional de tabuinhas. Havia também,  um bom Violinista,Toninho Vieira . Recordo com saudade a famosa Orquestra Musical, composta pelos seguintes elementos: Toninho Vieira, Fernando “Nascimenta”, Armindo e Duarte Picamilho, José Teixeira “Arrobas”, os irmãos Amândio e Luís Reis, António e Manuel “Alfaiate(s)”. Estes elementos, mesmo desconhecendo qualquer nota musical, davam boa música de ouvido, para grandes bailaricos na praça e em outras localidades vizinhas.

Nos verdejantes campos, a agricultura abundava e, lá longe,  alguém repetia as canções de então. Era festa nas ceifas (cegadas), nas malhadas, nas desfolhadas nas vindimas, etç etc. Nos montes, existia muita fauna, sobretudo a da caça  e  a flora cobria as encostas e era protegida dos incêndios.

Domingo à tarde, visitavam-se algumas adegas, jogava-se o fite e fazia-se o bailarico na praça ou perto junto à ponte. O Mário Picamilho e o Capela, sempre harmonizavam  que as tardes fossem de convívio. Se alguém de carro pretendesse passar, teria que esperar que alguém autorizasse, porque o baile não podia ser interrompido até ao fim da música.  

Quem viesse a Sta. Valha escolher namorada, fosse quem fosse, teria que pagar na taverna um cântaro de vinho e até algum trigo para todos beberem e comerem, era tradição.

Os “Rôlos” e a sua equipa organizavam o Carnaval, a Serrada da Velha, a Partilha e Testamento do Burro contra a vontade do Regedor e GNR, nem que fosse próximo da  madrugada, havia que partir o burro. Por vezes também se fazia o enterro do Entrudo. Era engraçado de se ouvir, pois estava tudo na expectativa, em particular, as moças casadoiras e algumas senhoras solteiras, que não gostavam nada do que ouviam, se lhes tivesse calhado um verso e umas das partes do animal que não fosse do seu agrado. Se porventura alguma reclamasse, no ano seguinte seria bem pior. Havia versos “brejeiros” para todos os gostos.

Tínhamos um Padre (João), um Sacristão (Kico), dois Professores, duas Escolas (Bairro Ciprestes e Adufas), uma Padaria e vários Fornos de Cozer, três Alfaiates, três Carpinteiros, quatro Serradores, seis Barbeiros: José Maria Cagigal, que emigrou para o Brasil  (que também era bom na concertina e a cantar), os irmãos Vieira: Arménio, João e Toninho, e os Mairos (Manuel e Teófilo), etc., etc.. Todos eles recebiam produtos da lavoura pelo seu trabalho, duas Funerárias,  dois Ferreiros, uma Serralharia Civil (a do Chelas), três Sóqueiros (Zé da Deolinda; Agostinho do Calvo e Augusto Ervões), três Sapateiros (Zé Cavalheiro, Chico Boica, e, mais tarde, o Armando), quatro Lagares de Azeite, (dois industriais e dois artesanais puxados por animais), dois Cantoneiros ( Abel e Rodolfo), uma Moagem de farinha, um Talho (do Amadeu Pedreiro) , vários Moinhos, muitos Comércios e Tabernas, duas Funerárias (Augusto Simão e Adelaide Astorga), etc.; e ainda, o "porquinho" de Sto. António, “nosso/a mascote”, que corria diariamente a aldeia de chocalho ao pescoço,  em busca de quem lhe desse algo para comer.

Tínhamos também o muito QUERIDO Dr. Olímpio Seca, sempre atencioso a consultar… ,e,  se a doença fosse grave, de imediato havia sempre lugar no seu carro. Dada a sua generosidade como médico “dos pobres”, no meu entender, a estrada Vilarandelo a Pardelinha deveria levar toda ela o SEU nome.

Não me posso esquecer do Toque das Trindades, “após o sol desaparecer e antes de anoitecer”, hora de recolha a casa, em particular os mais novatos e, onde os mais velhos , davam ordens desse dever, que todos acatavam. Também os jogos de futebol ao domingo, primeiro, no campo das Lages e,  mais tarde, no do Cruzeiro, onde não faltava mocidade para formar duas ou três esquipas; Durante o jogo, aparecia sempre um ou dois cântaros de vinho para matar a sede. Também a tradicional Fogueira do Natal na praça, onde a lenha era antecipadamente apanhada em carros de bois e às costas: Já pela noite dentro, com o excesso de bebida oferecida, a situação levava por vezes a desavenças (bordoada/estadulhada) entre alguns presentes, em particular, com  os que não tinham ajudado  na tarde à lenha, mas que queriam mexer (esferrunchar) no fogo, sem autorização, era praxe.

           TODOS estes e muitos mais merece que se fale neles, que se recordemos bons tempos.

Tempos esses, onde a pobreza abundava e as condições de vida eram muito precárias, mas a gente era humilde e vivia feliz.

Enfim, memórias nostálgicas de um passado onde tinha-mos muito pouco, mas tinha-mos quase tudo.

 

Publicação: Carlos S. Mourão Fontoura (Carlos Sá) - 67 anos de idade.

Jornal “Tribuna Valpacense ”Rubrica: Conta-me como foi….”  Fevº. de 2013)  

 

 

 

Festa de São Caetano da minha terra. 

A nossa festa foi e, continua a ser, no segundo domingo do mês de Agosto.

Em tempos passados, nesse dia, era mesmo dia de festa, com muito gosto, animação e também alguma ansiedade, particularmente para a rapaziada.

Adornavam-se muitos andores, cada qual inspirado no mais bonito Santo da Paróquia, com o de São Caetano a marcar diferença, estes, a cargo, quase sempre, do andoreiro de Fornos do Pinhal, senhor Pinheiro. Eram tão grandes que era preciso força e habilidade para continuar o passo, mas a mestria dos orientadores no percurso dos quatro bairros, Benjamim Picamilho, Aniceto Picamilho, Amador e António “Arrobas”, fazia com que tudo corresse afinado.

Começava o dia com o mais entusiasta e melhor pirotécnico da nossa terra, o Toninho Rolo, que nem dormia na véspera, para nos deleitar com a sua alvorada de morteiros e muitos mais ao longo do dia. De tão entusiasta nesta arte, penso, que nem tempo tinha para ver o grandioso espectáculo.

Eram dois fogueteiros - de fama - ao despique, num arraial digno de ver e apreciar, e o CHARRUA de Vilarandelo até só p’lo nome, fazia estremecer as redondezas.

Havia copos por todo lado e a “pucarinha” nunca faltava para os amantes deste jogo, que só conseguiam ver os dados e as cartas com a ajuda do gasómetro ou lampião. A roleta dos realejos, navalhas e outros utensílios, fazia “cegar” os mais jovens.

Havia também duas bandas de musica ao desafio.., qual a melhor. Havia também uma "planta" de eletricidade "portátil", para fornecer o gira-discos de quatro "bocas" de altifalantes instalados no cimo da Capela e da iluminação das bonitas Igreja e Capela do nosso devoto São Caetano, e ainda, as fracas lâmpadas dos lugares adjacentes.

O motor que a gerava essa luz ficava instalado por traz da Capela, pois nem o barulho e os cântaros de água que gastava para o arrefecer, incomodavam o pessoal. A aparelhagem sonora tocava e dedicava discos às namoradas(os), e a poeira do baile do arraial era sinal de uma festa viva e muito animada, que nunca terminava antes das três ou quatro da madrugada, com, por vezes, uma ou outra intervenção pelo meio da Guarda Republicana a repor a ordem em alguns com copos a mais.

No dia seguinte, logo de manhã cedo, os miúdos, ainda com o sabor na boca de alguns pirolitos ou outro refresco açucarado com água da fonte de bem perto, apanhavam molhos de canas dos foguetes rebentados no arraial, olhando ao mesmo tempo para o desgaste dos sapatos - de pano, é claro - e restante vestuário, que teria de durar até à próxima festa. Enfim…, memórias de outros tempos que jamais esquecerei.

A bênção dos rebanhos do gado bovino e de outros animais era feita logo pela manhã. Cada pastor ou proprietário levava o seu rebanho ou outros animais para a bênção; davam umas voltas à capela, conforme a promessa feita, e todos estes ficavam benzidos. Por vezes tornava-se difícil segurar alguns rebanhos de gado, só conseguido com a ajuda de vários populares que assistiam. O produto de algumas destas promessas, -centeio, vinho, etc. - , era leiloado em conjunto com outros artigos de outras promessas ao Santo na parte da tarde, onde também não faltava grande animação e até alguma disputa à mistura de quem arrematava e contribuía mais para o Ele.

Nesse dia, os tradicionais CORDEIRO e ALETRIA enchiam por um dia a farta mesa de todos, bebia-se o melhor vinho pré-reservado e tudo era em honra de SÃO CAETANO, da minha terra, Santa Valha, que julgo que ainda continua a ser a única festividade em honra deste Santo no nosso Concelho.

Carlos Sá.

Nota: Memória publicada no Jornal “Tribuna Valpacense ” em 2012.

 

Primeira Festa em Honra de São Caetano:

São Caetano “de Thiene” é o padroeiro” da festa de Santa Valha, Santo este, que o nosso povo venera com muita fé e devoção. A sua imagem encontra-se, e muito bem, não sabemos desde quando no interior da capela de São Miguel, mais propriamente no Altar-mor, ao lado de São Miguel. Neste Altar, existem duas imagens de São Caetano, conhecidas pelo: São Caetano “Velho” e São Caetano “Novo”.

Consta-se, que a imagem “nova” de S. Caetano, foi adquirida na década de 1950, por uma das comissões de festas, em virtude da imagem antiga já estar um pouco danificada, porventura devido às inúmeras colocações no andor nas procissões das festas, ou ainda, por ter sido enviada a imagem antiga para restauro por esse ou outro qualquer motivo.

Há ainda algumas pessoas que confundem o padroeiro “da festa” de Santa Valha, que é São Caetano, com a Padroeira (Orago) de Santa Valha, que é Santa Eulália “de Mérida”, cuja imagem desta Santa encontra-se no Altar-Mor da nossa Igreja Matriz.

São Caetano nasceu em Itália, mais propriamente em Veneza, no ano de 1480, vindo a falecer também em Itália, Nápoles, no ano de 1547. Foi canonizado pelo Papa Clemente X em 1671 e  as suas relíquias estão guardadas em Munique (Alemanha) e em Nápoles. Entre outros títulos, são Caetano é conhecido como o pacificador dos populares. Na arte, São Caetano é descrito como monge Teatino. É padroeiro dos treatines e dos animais domésticos. A sua festa na comunidade cristã é celebrada no dia 7 de Agosto, dia da sua morte.

A primeira festa na nossa terra em honra deste Santo foi no ano de 1950. Para essa primeira festa, foram eleitos 10 Comissários, quase todos eles com algumas posses: António Avelino da Cunha (Toninho), Francisco “Ferruge(m)”, João Cardoso “Ribeiro”, José Domingues (Sarrá), Domingos Lopes, Cândido dos Santos, Lafaiette Alves, José Vicente Gonçalves (Feijão), Francisco Batista (Roque) e Maurício Morais. Todos estes comissários entraram com uma manda pessoal de 100 escudos (moeda de agora 0,50 €), cada um, bastante dinheiro na época. Contudo há divergência de memória, por parte alguns desses mais idosos, quanto à primeira Banda Musical a actuar nesse ano de inauguração: Banda Musical de Valpaços, de Vilarandelo, de Rio Torto, ou ainda de Mateus( Vila Real)?????

No contacto com essas tais pessoa idosas, informaram-nos todavia, que antes de se realizar a  primeira festa em honra de “São Caetano”, festejava-se anualmente na nossa aldeia, duas festas: a de Santa Bárbara no inverno, e a do Santo Cristo no verão.

Não obstante, o dia de São Caetano ser celebrado no dia 7 de Agosto, na nossa aldeia nunca coincidiu com essa data. Foi sempre realizada no “segundo domingo” do mês de Agosto, excepto uma vez, no ano de 1983.

A comissão de festas desse ano, cujos mordomos eram entre outros: Manuel Barrosão, José (Zé) Domingues, Jaime e Fernando Alves e ainda Vicente Domingues,  resolveu, por iniciativa própria, antecipar o dia festivo para o domingo da semana anterior, se bem que de não muito agrado da maioria da população. Aconteceu, porém, que por volta das 15 horas da tarde desse dia, antes de se realizar a procissão, despenhou-se uma enorme tempestade de trovoada, tipo tromba de água, com mais incidência sobre a parte poente e centro da aldeia e com vários prejuízos para muita gente, particularmente nos comerciantes. A água chegou a atingir em certos locais da aldeia mais de meio metro de altura, mas há hora da procissão (18 horas), nem uma pequena nuvem se via no céu ou vestígio de tempo menos bom.

Desde a primeira festa de 1950 até á data de hoje (2013), só por duas ou três vezes é que se não realizou festa na nossa aldeia em honra do nosso Santo por motivo de dificuldade de aceitação de comissários ou mordomos eleitos.

Também os mais idosos não sabem explicar nem  se recordam de ouvir falar aos seus antepassados, a razão ou motivo pelo qual nunca se festejou até 1950 na aldeia este Santo, nem mesmo o São Miguel e a Santa Maria Madalena até à presente data (2013), cujas imagens sempre tiveram um espaço edificado próprio de acolhimento.

Nota: “Artigo publicado no Bloco de Notícias Breves do nosso Site em 05-08-2013.”

 

 O Vinho Namora:

Era herança tradicional, quem se enamorasse em Santa Valha é porque era nosso amigo. Era porque aqui que se encontravam as mais belas e bonitas raparigas de todo Trás-os-Montes. Sabiam fazer boas merendas, eram capazes de tudo, mas muito tímidas. Não havia problema com o ser maria-rapaz, destemidas, capazes a par no dia-a-dia, até nos afazeres mais rudes como: semear, colher, vindimar, etc. Serviam de pastoras e não tinham medo dos lobos, nem de outra bicharada. A vindima e a azeitona era mais depressa quando algumas vinham no nosso grupo. Tínhamos autênticas Barbys locais. Os rapazes sempre derretidos em "atenções" especialmente ao ir á fonte; os que ajudaram a levar o cântaro vazio, era para sonhar, nem que fosse á distância, perseguíamos. Não havia problema algum em andar com bois, cavalos ou outros animais. Havia certa crueldade quando os varejadores jovens subiam ás oliveiras mais altas em tempo de frio. Faziam-no descalços e, quando distraídos, havia sempre alguma rapariga lhe havia mijado nos socos. Era um prémio que só as mulheres sabiam.

O vinho namora, produto desconhecido do rapaz namoradeiro de fora, era um almude e por vezes acompanhado de trigos de cantos da sua altura, conforme a sentença popular. Teria que beber e dar a beber a todos os presentes e não eram poucos junto às tabernas. Concentravam-se em cordialidade e vinham mais almudes. Era injusto, os rapazes das nossas anexas do Gorgoço, Calvo e Pardelinha  também  terem de pagar, senão não havia namoro. Por causa de não querer pagar o vinho, a rapaziada de Sonim foram proibidos até de passar na "nossa" estrada. Passavam a pé pelos montes. Nos dias de feira de Vilarandelo, escondidos lá se metiam na carreira, vinha outra promessa falhada e o Sr. Paulino da carreira sempre ajudava, até porque havia sempre um ou outro mais abrutado e ignorante que gostava de resolver o caso á sua maneira.

Ninguém acreditava que a coisa era tão a sério, então o Sidónio de Valpaços lá porque era do Tribunal, quis ignorar a conhecida e lembrada tradição. Este prometia e prometia, mas nada, mas para continuar a namorar na nossa aldeia teve mesmo que pagar o vinho. Igual ao Adelino  Alves de Soním, Manuel Guedes de Valpaços, etc. Esta obrigação marcou para sempre o dia a todos estes e muitos outros mais e certamente agora estão felizes por ter ajudado a continuar a nossa tradição. Era uma emoção de alegria para todos por se ter conquistado mais um amigo para a aldeia.

Carlos S. Mourão Fontoura

(Carlos Sá)

Nota: Memória publicada no Jornal “Tribuna Valpacense” em 2012.

 

Santa Valha, 01-03-2011

(Última actualização em 01 de Março de 2015)